Desafios da Vacinação Contra a Covid-19 em Manaus: um Aspecto Tecnológico

O Programa Nacional de Imunizações (PNI) tem ampliado seu escopo de atuação, produtos e tecnologia, garantindo acesso gratuito às vacinas e proporcionando melhor qualidade de vida à população, sobretudo em Manaus, que foi epicentro da pandemia de COVID-19 no Brasil com o colapso da saúde com recordes de internações e enterros. Diante desse cenário, é importante criar alternativas tecnológicas de monitoramento e avaliação das campanhas vacinais contra a epidemia em municípios de grande porte populacional. O objetivo deste estudo foi descrever o processo de desenvolvimento e implementação de um Sistema Municipal de Vacinação (SMV), criado com o intuito de apoiar o plano municipal de vacinação contra COVID-19 e contribuir para a superação dos desafios impostos pela indisponibilidade do sistema nacional de vacinação e da crise de saúde pública na cidade de Manaus. Foram utilizadas técnicas da pesquisa descritiva, identificando e abordando as principais características, experiências e desafios envolvidos na construção deste produto de software e sua aplicabilidade. Com o SMV, gestores municipais e estaduais, órgãos de controle e regulação, usuários do SUS e instituições de pesquisa passaram a obter acesso à informação de forma eficiente, transparente e padronizada, possibilitando maior assertividade na tomada de decisão e eficácia concernente ao planejamento de estratégias e ações. A utilização do sistema possibilitou também o registro das doses aplicadas, em tempo real, o controle dos recursos envolvidos no processo, a emissão do certificado municipal e integração com a Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS). Concluímos que o SMV tem sido uma ferramenta indispensável para os gestores e técnicos em saúde da secretaria municipal.

O processo de informatização dos dados de vacinação utilizado pelo Ministério da Saúde (MS), a partir de 1994, registrava dados acerca das doses aplicadas e locais disponíveis para vacinação, padronizados por horário e público-alvo. Após a avaliação realizada sobre a funcionalidade do sistema de informação, visando mensurar a sua eficácia, diagnosticaram-se limitações relacionadas à transferência de dados, segurança, autenticidade, armazenamento, integridade dos dados e dificuldade na rastreabilidade de usuários do SUS (CONASEMS, 2023). O Plano Mundial para Vacinas (GVAP), aprovado pela Assembleia Mundial de Saúde em 2012, publicou em seu resumo sobre o progresso alcançado pela Região das Américas que o fortalecimento dos sistemas de informações (SI) ainda é um desafio a ser superado. O GVAP aconselhou que os países do continente americano deveriam explorar o uso de novas tecnologias e trabalhar arduamente para assegurar a alta qualidade da coleta, do manejo, da análise e do uso de dados, em todos os níveis, visando assegurar solidez e assertividade nas tomadas de decisões (CONASEMS, 2023). Visando mitigar as limitações, foi desenvolvido o Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), sendo recomendado que os municípios migrassem o registro de vacinação para este sistema, visando aumentar a qualidade dos dados e possibilitando o acompanhamento da sua situação vacinal do usuário do SUS. Apesar do empenho e dos recursos financeiros envolvidos em sua implantação, sua adesão foi tênue. Atualmente, segundo o estudo, o principal gargalo existente no processo ocorre pela dificuldade de transmissão de dados para a base nacional e pela demora do DATASUS no processamento dos dados transmitidos, sobretudo devido à incompatibilidade de versão do SI-PNI com SI próprios desenvolvidos e utilizados por alguns municípios (CONASEMS, 2023). Ainda segundo a pesquisa nacional, tendo como base os estudos de Kerr et al. (2021), a região norte foi a mais afetada pela pandemia de Covid-19, necessitando de uma intervenção mais rápida e enérgica. Nesse período, o processo de vacinação contra à COVID-19 foi marcado por dificuldades, incertezas e falta de informação. A indisponibilidade de ferramentas eficazes para o registro das doses aplicadas e para o controle dos insumos vacinais e dos recursos humanos envolvidos motivou a criação de uma solução municipal para geração de informação que permitisse a gestão adequada de cobertura vacinal.

As estratégias de vacinação implantadas pela Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA) na cidade de Manaus foram definidas pelo Programa Nacional de Vacinação (PNI), organizadas por grupos prioritários e conforme a disponibilidade de imunizantes. Foram realizadas parcerias para a organização e montagem de postos de vacinação com universidades públicas e privadas, além de outras instituições, dentre as quais destacam-se a Fundação de Vigilância em Saúde (FVS), Secretaria do Estado de Saúde (SES) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Visando evitar aglomerações, a secretaria convocou a população elencada pelo calendário de cada mês de nascimento, divididos em dias da semana. Quanto ao recurso humano, para o local de vacinação, a SEMSA designou profissionais de diversas áreas para trabalhar na coordenação, na triagem dos usuários, logística, condução de veículos, digitação de dados e manutenção da ordem. Quanto aos postos de vacinação terrestres e ribeirinhos, foram designados vacinadores e registradores específicos e capacitados para esta ação. Foram contratados veículos para atuar em períodos integrais, das 7 às 13 horas e das 13 às 19 horas. Para a zona rural foram contratadas lanchas com capota e coletes para toda a tripulação, com piloto para uma jornada de 8h/diária. A secretaria providenciou recurso material, insumos para a vacinação, material de vestuário e de apoio para as equipes (SEMSA, 2021). No contexto das estratégias de comunicação, poderiam ter sido intensificadas ações de mobilização em redes sociais para disseminar informações de incentivo à vacinação e conteúdos para contestar e mitigar a onda de desinformação, movimentos antivacinas e discursos anticientíficos, fenômenos que ganharam notoriedade e relevância a partir durante a pandemia de Covid-19. Demais estratégias frente à problemática de desinformação e hesitação vacinal poderiam ter sido apresentadas. O Departamento de Tecnologia da Informação da Secretaria Municipal de Saúde de Manaus desenvolveu e implantou o Sistema Municipal de Vacinação (SMV), para apoiar ações, estratégias e o plano de vacinação, com o intuito de apoiar na superação dos desafios de falta de informação e de ferramentas de controle. A utilização do SMV possibilitou a integração com a Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), sendo possível contabilizar as doses aplicadas em todo município, consultá-las por meio do CPF do cidadão, obter informações sobre locais de vacinação, unidade de saúde e atendimento para casos suspeitos, em tempo real, informações diversas e certificados de vacinação, dentre outros, garantindo confidencialidade, integridade, disponibilidade, autenticidade, desempenho, segurança e transparência no processo. O SMV, desde o início de seu funcionamento até 2022, registrou e transmitiu para a RNDS um total de 5.018.137 doses aplicadas, em 2.028.827 de vacinados, e contou com a participação de 2432 vacinadores e 3685 registradores em 320 postos de vacinação na região metropolitana de Manaus. Com ele, é possível ter mais controle dos dados coletados e agilidade para implementação de mudanças estratégicas para a melhoria de cobertura vacinal, sendo uma ferramenta com maior compatibilidade com as necessidades do município. Um dos grandes benefícios percebidos pelos usuários do sistema foi a obtenção da informação em menor tempo, possibilitando rápida tomada de decisão nas ações de vacinação no município. Além disso, a informação acerca dos dados vacinais chega à população de forma clara e inteligível, por meio do módulo “Vacinômetro”, permitindo que a sociedade acompanhe a evolução das campanhas anuais de vacinação contra a COVID-19 em Manaus, e obtenha informações acerca de suas próprias doses, pelo módulo “Imuniza”. Possibilita ainda que o cidadão, ao verificar alguma incoerência, possa solicitar a devida correção por meio dos canais de ouvidoria do SUS. A rápida criação do SMV atendeu às necessidades das equipes de gestão e vacinação e permitiu que o andamento do registro de doses fluísse de forma ágil, mesmo durante os momentos iniciais e críticos da vacinação, em que ainda não havia doses disponíveis para todos. É um sistema em constante aprimoramento, e que evolui consoante a progressão das atividades do processo de vacinação.

O uso de um sistema de informação para registro de dados e geração de informação foi de extrema importância no início da vacinação contra a COVID-19 em Manaus. A possibilidade de registrar, transmitir e publicizar dados coletados possibilitou à gestão municipal a tomada de decisões em tempo mais oportuno, o planejamento e a execução das atividades futuras concernentes à campanha de vacinação. Não fosse o desenvolvimento do SMV em um período extremamente curto, teria sido impossível atender às necessidades de informação dos gestores e dos órgãos de transparência e de controle, especialmente nos momentos iniciais da vacinação, posto que não havia um sistema nacional em operação naquele instante e havia uma necessidade de controlar um estoque limitado de vacinas para população. A informação gerada conforme a necessidade local aliada às atividades da gestão e comunicação municipais serve de subsídio para as equipes de atenção à saúde na ampliação do alcance da cobertura vacinal e minimizar os números de pessoas com doses em atraso ou sem vacinação. O SMV foi desenvolvido considerando o contexto do município de Manaus, porém a sua arquitetura e o seu funcionamento pode ser replicável em outros municípios que também tenham necessidade de gerar informações locais mais específicas para apoiar gestão da vacinação contra Covid-19, garantindo, ainda, o envio de dados ao Ministério da Saúde por meio da integração com a RNDS. Por fim, o SMV pode ser aprimorado para, no futuro, fazer o registro de dados de outros tipos de vacinas, apoiar nas ações de planejamento de campanha vacinal, e operar na organização logística com menor esforço por meio de recursos de geolocalização e inteligência artificial, para identificar áreas que necessitam de ações de controle mais intensivas, sendo uma ferramenta que contribui para gerar impactos positivos no bem-estar da população manauara.

Principal

Rogério Luiz Araújo Carminé

Coautores

Alexandra Freire Muniz, Fabíola Mendonça da Silva Chui, Rafaela de Andrade Ferreira, Mário Sérgio Scaramuzzini Torres, Márcio Aurélio dos Santos Alencar Marcos Paulo Ferreira Mamede dos Santos Nazivaldo Caciocley Camelo Correa Saymon Erickson da Silva Souza Isabel Cristina Hernandes João Carlos Silva de Oliveira Danyel de Souza Marques

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23 dez 2023

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