Redução de danos é fundamental. Os dez anos de consultório na rua em Santo André(SP)

Apesar dos múltiplos conceitos de Redução de Danos (RD), como relatado no excelente “DROGAS E REDUÇÃO DE DANOS: uma cartilha para profissionais de saúde” (São Paulo, 2008, pg11), e apesar dos constantes ataques de descrédito, ela é uma estratégia fundamental, para efetuarmos as ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, abrangendo a promoção e a proteção da saúde, a prevenção e/ou redução de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, e a manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte positivamente na situação de saúde das coletividades como preconizado pelo MS, para toda a APS.
Cientes que a mais de 20 anos as ações de RD no Município foram iniciadas, “A partir de junho de 2002, o município de Santo André organizou suas primeiras ações de redução de danos, tendo como público principal as crianças e adolescentes em situação de exploração sexual que, na sua grande maioria, o fazem em troca de facilidades para se conseguir cocaína e crack” (Silva, 2009) e de que há 10 anos, a Unidade de RD, se tornou a Unidade de Consultório na Rua.
Baseamo-nos, no conceito de RD como: Uma estratégia de saúde pública, pautada no princípio da ética do cuidado, que visa diminuir as vulnerabilidades de risco social, individual e comunitários, decorrentes de comportamentos nocivos, reconhecendo o usuário em suas singularidades e construindo com ele estratégias, focadas na defesa de suas vidas, efetivamente incorporada nas ações do cotidiano do cuidado. Reconhecendo cada Munícipe em sua singularidade e garantindo seus direitos de cidadão uma vez que os mantém como protagonista, e o serviço atuando como fortalecedor de novas atitudes de vida, no qual o vínculo é encarado como estratégia primando à autonomia.

Efetuar, garantir e perpetuar, o cuidado em saúde, dos munícipes em situação de rua, do município de Santo André SP, tendo como norteadora a Política de Redução de Danos. Que nos facilita garantir a universalidade de acesso, integralidade de assistência, preservação da autonomia das pessoas, a assistência à saúde sem preconceitos ou privilégios e com equidade, o direito à informação, o estabelecimento de prioridades pela epidemiologia e com a participação dos munícipes atendidos.
Sustentar o cuidado em uma via de mão dupla, com usuário procurando o serviço e/ou o serviço realizando a busca ativa dele no território. Sempre mantendo e fortalecendo os vínculos culturais e comunitários dos usuários, seguindo a lógica de território e rede do conceito de Clínica Ampliada.
E assim garantir a Equidade e expandir o acesso ao Sistema Único de Saúde, da população de maior vulnerabilidade do município.
Metodologia:
Desde a implantação como Programa de RD, com os profissionais focando no cuidado em liberdade e no desejo dos atendidos, seguindo uma abordagem de baixa exigência, que aceita, reconhece e estimula o protagonismo e a emancipação dos usuários, assim criando uma forte parceria.
Baseamos os atendimentos em tecnologias leves (Merhy, 2002), sem a obrigatoriedade de fornecimento inicial dos dados pessoais, mas garantindo os constantes encontros até que a confiança se estabeleça e o/a munícipe aceite fornecer esses dados. Ou aceitando realizar cuidados difíceis, como um pré-natal na rua, mas convidando a gestante a participar como protagonista desse processo e informando sempre de forma clara, objetiva e sem julgamentos os riscos implicados.
No CR o próprio processo de construção do PTS, é realizado seguindo a baixa exigência, com metas simples e de fácil realização e que se inicia com o diálogo de questões básicas de saúde, como acesso a água potável. O que muitas vezes é feito enquanto oferecemos água para beber.
O levantamento do histórico da pessoa, também não é obrigatório para o cuidado, sendo uma conseqüência de uma boa aliança, e muitas vezes a Planilha de Cadastro Individual do E-sus, leva meses para ser plenamente preenchida.
As parcerias com outros serviços são fundamentais, ampliando as possibilidades de acesso a cuidados que vão além da saúde, diminuindo a exclusão social e possibilitando o encontro com outras formas de cuidados. Possuímos fluxogramas de atendimento conjunto com o CAPS AD e com o Hospital da Mulher, realizamos visitas constantes aos usuários durante as internações nas UPAS, e fortes parceria com o Centro Pop, onde realizamos regularmente atendimentos, a todos que desejarem, aproveitando para fazer educação em saúde nesses dias.

Os resultados quantitativos, de uma experiência tão ampla, são difíceis de definirmos, mas utilizando os Registros do SISAB / E-SUS, para levantamentos das informações, podemos citar os seguintes dados:
Foram registradas na Rua, 137 consultas de Pré Natal, 317 coletas para baciloscopia de TB, 307 atendimentos para testagem de ISTS, e um foco significativo nas avaliações de uso de álcool 6.439, outras drogas 7.849, saúde mental 4.580 e tabagismo 4.518, refletindo o comportamento dos nossos atendidos e a dura realidade das ruas. Além disso tivemos 15 consultas de avaliação de obesidade, o que desmistifica a ideia de que todos na rua só sofrem de desnutrição e nos demonstra que a baixa qualidade de alimentação também pode trazer problemas.
É possível compreendermos que pelo vinculo de confiança e reconhecimento do direito a acesso a saúde, estabelecido ao longo dos últimos 10 anos, o número de Atendimento Individual e Atividades Coletivas segue em crescimento, pois não houve um aumento do número de pacientes atendidos, afinal nossos números de Cadastro Individual se mantêm relativamente estável e não tivemos grandes oscilações em números de funcionários. E mesmo em 2023, em que tivemos demora no cadastro dos profissionais novos, os números das atividades coletivas permanecem e os números de participantes aumentam, pois não tivemos troca dos Redutores de Danos que são os principais responsáveis pelas atividades de educação em saúde.
Além disso temos o fato que em 10 anos, nunca um trabalhador da equipe sofreu qualquer violência física, pois o vinculo e a proximidade com os usuários do serviço, sempre foram conquistado pelo respeito mútuo, estabelecido nos atendimentos, respeitando os desejos dos munícipes e o limite de atuação dos trabalhadores.

Mesmo com as mudanças de gestão, podemos compartilhar nossa experiência de manter a Redução de Danos como Política Norteadora do cuidado, dos munícipes em Situação de Rua em nossa cidade, só mantida pelo comprovado acesso, qualidade e efetivação do cuidado.
É sabido que essas estratégias são passiveis de serem replicadas por qualquer unidade de saúde, de forma integral na atenção primária e com pequenas adaptações para unidade de atenção secundária, hospitalares e de urgência.
Concluímos que evitando julgamentos morais e oferecendo uma variedade de políticas e de procedimentos que visam à redução das consequências prejudiciais dos comportamentos de risco, a Unidade de Consultório na Rua, focada na Redução de Danos, busca garantir a reinserção dos usuários em seus núcleos sociais, melhorando sua qualidade de vida e o acesso a direitos fundamentais, realizando parcerias com as redes de cuidado e com os munícipes, inclusive realizando ações no território partindo da necessidade e a pedido dos pacientes, mantendo assim, o processo de construção de estratégias mais seguras, adaptáveis e eficazes de autogestão e autocuidado, necessariamente incluindo o protagonismo e a emancipação do usuário, que é conhecedor de si mesmo e do seu território.

Principal

Antonio Rinaldo Pagni

arpagni@santoandre.sp.gov.br

Encarregado Técnico de Saúde

Coautores

Claudemilson José do Nascimento, Daniel Pereira e Silva, Erika Sanchez, João Vitor Dudek, José Félix de Oliveira,Leonardo Felipe Rocha, Maria do Carmo do Nascimento Dias, Mábila Rodrigues, Nilzete Aparecida Pereira Borges

A prática foi aplicada em

Santo André

São Paulo

Sudeste

Esta prática está vinculada a

Rua Coronel Ortiz, 18 - Centro, Santo André - SP, Brasil

Uma organização do tipo

Instituição Pública

Foi cadastrada por

Antonio Rinaldo Pagni

Conta vinculada

31 out 2024

CADASTRO

31 out 2024

ATUALIZAÇÃO

01 jun 2002

inicio

Condição da prática

Andamento

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