Resumo
Este artigo apresenta uma proposta de integração entre os fundamentos da Medicina Tradicional Chinesa (MTC) e as ervas nativas da Mata Atlântica, com foco no território do extremo sul da Bahia e nas práticas clínicas do NPICS Brasil e do Espaço Flor de Lótus. A pesquisa é fundamentada em uma revisão crítica de literatura científica nacional e internacional, com destaque para autores como João Curvo, Fabrício Borges, Peter Liu, Flávio Passos e Karine Kaligaris, além de evidências das plataformas SciELO e Plataforma Brasil (2019–2024). É apresentado um protocolo mensal de uso dos fitoterápicos, adaptado às estações do ano, à biotipologia energética e às marés lunares, com vistas a promover saúde integral, pertencimento e autonomia comunitária. O artigo também discute os limites da automedicação, os riscos da prescrição sem avaliação clínica e o cuidado necessário com o uso de fontes populares (como blogs e canais de vídeo), que nem sempre se sustentam em evidências científicas. A prática no Espaço Flor de Lótus é destacada como um exemplo ético, seguro e eficaz de aplicação comunitária dos saberes integrativos.
Palavras-chave: fitoterapia chinesa, ervas brasileiras, biotipologia, protocolo sazonal, saúde integrativa, Mata Atlântica, NPICS Brasil.

Abstract
This article presents an integrative proposal between Traditional Chinese Medicine (TCM) and native plants from Brazil’s Atlantic Forest, focusing on practices in southern Bahia, especially within NPICS Brasil and the Espaço Flor de Lótus. The study is based on a critical literature review including national and international authors such as João Curvo, Fabrício Borges, Peter Liu, Flávio Passos, and Karine Kaligaris, as well as evidence from scientific databases such as SciELO and Plataforma Brasil (2019–2024). A monthly herbal protocol is presented, structured according to the seasons, individual biotypology, and lunar energy cycles, aiming to promote holistic health, a sense of belonging, and community autonomy. The article also highlights the risks of self-medication, the dangers of unsupervised herbal use, and the importance of distinguishing between scientific sources and popular media such as blogs and YouTube channels. The clinical experience at Espaço Flor de Lótus is featured as a safe, ethical, and effective model for integrative community health.
Keywords: Chinese herbal medicine, Brazilian herbs, biotypology, seasonal protocol, integrative health, Atlantic Forest, NPICS Brasil.

1. Introdução
A fitoterapia, enquanto ciência e arte do cuidado por meio das plantas medicinais, tem sido praticada por diversas culturas ao longo da história. No Brasil, a riqueza etnobotânica das florestas tropicais, especialmente da Mata Atlântica, oferece um campo fértil para o diálogo entre saberes populares e sistemas tradicionais, como a Medicina Tradicional Chinesa (MTC). Este artigo surge da prática vivencial e clínica desenvolvida no sul da Bahia, no âmbito do NPICS Brasil e do Espaço Flor de Lótus, onde se vem articulando os princípios da MTC com o uso das ervas locais, adaptadas à biotipologia dos pacientes e ao ritmo energético das estações do ano.
O trabalho parte da experiência territorializada em Santa Cruz Cabrália e Porto Seguro, incorporando protocolos mensais de chás medicinais utilizados como ferramenta de prevenção e promoção da saúde. Esta integração busca respeitar tanto a tradição chinesa quanto a realidade sociocultural e ecológica local. Diante da crescente popularização dos conteúdos sobre MTC em canais de YouTube, blogs e redes sociais, este artigo também faz um alerta para a importância da prescrição qualificada e da crítica às fontes não acadêmicas, que, embora úteis para a difusão do conhecimento, nem sempre apresentam fundamentação científica ou responsabilidade clínica.

2. Justificativa
O aumento do interesse por práticas integrativas e complementares no Sistema Único de Saúde (SUS) e o reconhecimento da MTC como uma dessas práticas autorizadas apontam para a necessidade de produção de conhecimento científico que legitime e sistematize o uso dessas técnicas no Brasil. Ao mesmo tempo, a cultura fitoterápica brasileira é vasta, porém fragmentada, e muitas vezes ignorada nos grandes centros de formação profissional. O presente estudo visa suprir essa lacuna ao documentar uma experiência real, ética e replicável no cuidado com ervas, unindo saber local e saber tradicional oriental, em uma perspectiva crítica, segura e sustentável.

3. Objetivos
Objetivo Geral:
Investigar, sistematizar e divulgar a experiência de aplicação da fitoterapia chinesa com ervas brasileiras no contexto do NPICS Brasil, com foco na atuação do Espaço Flor de Lótus no município de Santa Cruz Cabrália – BA.
Objetivos Específicos:
Relacionar os princípios da MTC (Yin-Yang, Cinco Elementos, Zang-Fu) com as ervas da Mata Atlântica disponíveis na região;
Apresentar um protocolo mensal de uso de chás, adaptado às estações do ano e à biotipologia dos indivíduos;
Discutir os riscos da automedicação e da divulgação de conteúdos não validados cientificamente;
Fortalecer a integração entre práticas comunitárias e saberes acadêmicos no cuidado em saúde integral.

4. Metodologia
Trata-se de um relato de experiência com abordagem qualitativa, embasado na observação participante, diário de campo, registros clínicos de atendimentos realizados entre 2020 e 2025 no Espaço Flor de Lótus, além de uma revisão integrativa da literatura. Foram consultadas fontes nas bases SciELO, BVS, PubMed e Plataforma Brasil, incluindo artigos dos últimos cinco anos que abordam fitoterapia chinesa no Brasil, biotipologia, sazonalidade terapêutica e saúde integrativa.
A seleção de plantas foi feita com base em sua disponibilidade local, conhecimento etnobotânico regional, tradição popular, propriedades energéticas segundo a MTC, e segurança no uso. O protocolo mensal de chás foi construído considerando os princípios de adaptação climática e energética, conforme as estações do ano (primavera, verão, outono e inverno), os ciclos lunares, e os aspectos emocionais e fisiológicos observados nos atendimentos.

5. Resultados e Discussão
A experiência clínica acumulada ao longo de cinco anos de atuação no Espaço Flor de Lótus, integrado ao NPICS Brasil e ao CEJUSC de Santa Cruz Cabrália, permitiu a elaboração de um protocolo mensal de fitoterapia, baseado em princípios da Medicina Tradicional Chinesa e adaptado à flora local da Mata Atlântica. O protocolo é flexível, com orientações gerais por estação do ano, levando em conta o clima predominante, o elemento energético correspondente (Madeira, Fogo, Terra, Metal, Água), e a biotipologia do indivíduo (mais yin ou mais yang).
Protocolo Mensal de Uso de Chás – Espaço Flor de Lótus (Síntese por Estação)
Janeiro a Março (Verão – Elemento Fogo)
Indicação: Evitar calor interno, agitação mental e excesso de yang.
Chás: Capim-limão (calmante, digestivo), folha de mangueira (adstringente), folha de abacateiro (diurético).
Atenção: Evitar ervas muito quentes, como gengibre e canela, em pessoas yang.
Abril a Junho (Outono – Elemento Metal)
Indicação: Proteger pulmões e intestino grosso, combater secura e tristeza.
Chás: Guaco (expectorante), hortelã (refrescante), poejo (digestivo).
Atenção: Evitar excesso de folhas aromáticas em pessoas yin com fraqueza digestiva.
Julho a Setembro (Inverno – Elemento Água)
Indicação: Fortalecer rins e bexiga, aquecer o centro energético.
Chás: Canela (aquecedora), gengibre (circulação), folha de amora (equilibrante hormonal).
Atenção: Pessoas muito yang devem usar com moderação.
Outubro a Dezembro (Primavera – Elemento Madeira)
Indicação: Favorecer fígado e vesícula biliar, desintoxicar e circular.
Chás: Carqueja (depurativa), boldo do Chile (hepática), erva-doce (digestiva).
Atenção: Evitar uso prolongado de depurativos em pessoas debilitadas.
Discussão Clínica
A adoção deste protocolo no atendimento individual e em grupos terapêuticos mostrou-se eficaz para:
Aliviar sintomas leves e recorrentes como insônia, constipação, retenção de líquidos, irritabilidade e fadiga;
Reduzir a prescrição medicamentosa em casos leves;
Estimular o autocuidado e o pertencimento comunitário.
É essencial destacar que toda regra tem exceções. A prescrição no Espaço Flor de Lótus considera sempre a escuta ativa, a avaliação energética, a história de vida e os sinais clínicos. O uso contínuo de chás sem acompanhamento pode levar a intoxicações leves, perda de minerais, desequilíbrios térmicos e agravamento de padrões latentes.
Autores como Fabrício Borges (2019) e Flávio Passos (2021) alertam sobre os riscos da supergeneralização dos protocolos da MTC fora de contexto. Além disso, o uso indiscriminado de fontes digitais como YouTube e blogs populares pode induzir ao erro, especialmente quando não se avalia a constituição energética do paciente.
A prática do Espaço Flor de Lótus, por outro lado, tem servido como referência regional para a construção de protocolos sustentáveis, integrativos e baseados em evidência clínica, mesmo quando a literatura científica ainda não alcança toda a complexidade vivida no território.

6. Considerações Finais
A integração da fitoterapia chinesa com as ervas nativas da Mata Atlântica no extremo sul da Bahia representa uma importante contribuição para a prática clínica regional e para a promoção da saúde integral, fundamentada na sabedoria ancestral e no conhecimento científico contemporâneo. O protocolo mensal de uso de chás, adaptado às estações do ano, biotipologia e marés energéticas, tem demonstrado eficácia e segurança, quando aplicado com rigor clínico e acompanhamento profissional.
O estudo reforça a necessidade de reconhecimento das particularidades locais na prática da Medicina Tradicional Chinesa, incentivando a valorização da biodiversidade brasileira e o respeito às especificidades culturais e individuais. Além disso, destaca-se a responsabilidade ética dos profissionais em relação à prescrição fitoterápica, evitando a automedicação e a influência de conteúdos digitais sem respaldo científico.
O Espaço Flor de Lótus e o NPICS Brasil representam exemplos inspiradores de práticas integrativas que promovem saúde, pertencimento e sustentabilidade, integrando saberes tradicionais e práticas modernas no contexto do Sistema Único de Saúde e das políticas públicas de atenção básica.

7. Referências Bibliográficas
Borges, F. (2019). Fitoterapia chinesa e biotipologia: desafios da integração no Brasil. Revista Brasileira de Fitoterapia, 12(3), 45-59.
Curvo, J. (2018). Dieta do Yin Yang: fundamentos para a alimentação energética. Editora Holística.
Kaligaris, K. (2020). Acupuntura e fitoterapia: sinergias terapêuticas. São Paulo: Editora Saúde Integrativa.
Liu, P. (2017). Chinese herbal medicine: Materia Medica. Elsevier.
Passos, F. (2021). Fitoterapia chinesa adaptada ao contexto brasileiro. Jornal Brasileiro de Medicina Tradicional, 5(1), 22-34.
Ransolin, L. (2023). Experiência clínica no uso de ervas locais com base na MTC. Anais das Ações Online de Educação Popular em Práticas Integrativas do Npics.
Santos, M., & Oliveira, R. (2022). Uso de plantas medicinais da Mata Atlântica na atenção básica. Saúde em Debate, 46(128), 100-115.
Silva, A. et al. (2020). Fitoterapia no SUS: revisão sistemática da literatura. Revista de Saúde Pública, 54, 67.
Teixeira, C. (2019). Marés energéticas e ciclos naturais na fitoterapia. Revista de Medicina Tradicional, 14(2), 75-89.
Valente, D. (2021). Fitoterapia e práticas integrativas no contexto da saúde pública. Revista Brasileira de Saúde Coletiva, 29(1), 12-25.

Principal

Diego da Rosa Leal

npicscabralia@gmail.com

Enfermeiro Terapeuta Sistêmico

Coautores

Autores: Diego da Rosa Leal¹ Luceni Ransolin² ¹ Enfermeiro, terapeuta sistêmico, professor e coordenador do NPICS Brasil. COREN ID: 98607. Atua junto ao CEJUSC de Santa Cruz Cabrália. ² Acupunturista, especialista em MTC, responsável técnica pelo Espaço Flor de Lótus e consultora do CEJUSC de Santa Cruz Cabrália.

A prática foi aplicada em

Santa Cruz Cabrália

Bahia

Nordeste

Esta prática está vinculada a

Rua Sidrack Carvalho - s/n, Santa Cruz Cabrália - BA, 45807-000, Brasil

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