AVANÇOS NA AQUISIÇÃO DE MEDICAMENTOS SOB A ÓTICA DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA E DA LEI 14.133/2021 – UMA REVISÃO DE ESCOPO

As aquisições em âmbito público exigem uma análise constante dos gestores, com foco na eficiência, conforme estabelecido no art. 37 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). A Lei 8.666/1993 instituiu avanços no controle público e nas licitações, através dos princípios da legalidade, finalidade, isonomia e moralidade (BRASIL, 1993), enquanto que a atual Lei de Licitações, 14.133/2021, contribuiu com a atualização regulatória do tema, unificando as legislações sobre licitações, como a própria Lei 8.666/1993; a regulamentação dos pregões, Lei 10.520/2002 e; a regulamentação do Regime Diferenciado de Contratações Públicas, pela Lei 12.462/2011. A NLL melhorou os trâmites da fase de planejamento licitatório e contribui para aprimorar a transparência e eficiência (MACEDO et al., 2024).
Desta forma, a administração pública brasileira, de forma direta ou indireta, elege o processo administrativo conhecido por Licitação, como forma de abrir ao mercado a possibilidade de ofertar bens e serviços, por determinado tempo, segundo o critério de menor preço ou maior desconto (MOTTA, 2024).
Nesse contexto, o pregão eletrônico é a modalidade preferencial para aquisição de bens comuns pois permite a padronização das especificações dos produtos desejados, levando em conta sua qualidade e formas de apresentação, como no caso dos medicamentos Em especial, destaca-se o Sistema de Registro de Preços (SRP), um mecanismo que possibilita a fixação de preços para bens e serviços, facilitando para futuras contratações (LETTIERI, 2021).
Segundo a Política Nacional de Assistência Farmacêutica (BRASIL, 2004), a Assistência Farmacêutica é definida como um conjunto de ações voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde, tanto individual como coletivo, tendo o medicamento como insumo essencial, visando o acesso e seu uso racional. Compreendida como parte fundamental da Assistência Farmacêutica, a aquisição de medicamentos, pela Administração Pública, sofreu algumas mudanças pela modificação do arcabouço regulatório que rege as contratações públicas (MOTTA, 2024). Entretanto, a finalidade principal permanece: evitar o desabastecimento de medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS), um problema de saúde pública multifatorial.
Por mais coesa e coerente esteja uma licitação (fator interno), nem sempre há êxito em todos os itens pleiteados (fatores externos). Para Chaves (2020), há situações em que o mercado não tem interesse em elaborar propostas de venda, caracterizando uma licitação deserta. Em outros casos, as proponentes são desclassificadas por não atenderem aos requisitos mínimos previstos pelo processo, como ausência de documentação técnico-sanitária do fornecedor, preços de venda acima do máximo estipulado, ausência ou incongruência de documentação do produto ofertado, resultando em uma licitação fracassada. São em muitos desses casos que, até a elaboração/aprovação de uma nova licitação, ocorre o desabastecimento de medicamentos.
Em um cenário de desabastecimento, há a quebra de toda uma cadeia assistencial, iniciada pelo atendimento médico, perpassando pelo cuidado da enfermagem. A falha ocorrida neste tipo de evento vai em contraponto com o atendimento integral preconizado pela lei orgânica do SUS (BRASIL, 1990), que em seu artigo segundo informa: “A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.”
A inovação tecnológica e regulatória permitiu o surgimento de novas metodologias de trabalho e execução de atividades, atreladas ao desenvolvimento das tecnologias da informação, através do uso, monitoramento e controle por planilhas, formulários, computação em nuvem e inteligência artificial.

A Lei de Licitações, cuja obrigatoriedade foi instaurada a partir de 30 de dezembro de 2024, trouxe parâmetros que visam sanar alguns aspectos do processo de aquisição de medicamentos, como a exigibilidade dos documentos técnico-sanitários das empresas participantes, a elaboração de estudos técnicos preliminares e termos de referência e o aumento no valor orçamentário para inexigibilidade de licitação (MACEDO et al., 2024). Ainda assim, esta Lei possibilitou reduzir o desabastecimento de medicamentos? A presente revisão de escopo surgiu com a finalidade de debater sobre essa questão.

Foram coletados 26 artigos de acordo com os descritores apresentados, dos quais 13 eram duplicados. Foram excluídos 8 por não atenderem ao problema da pesquisa e/ou não utilizarem a Lei 14.133/2021. Utilizou-se o diagrama de fluxo (LIMA et al., 2024) para apresentar o fluxo de seleção. Nesta foram incluídos 5 artigos, sendo todos do tipo transversal, que podem ser exploratórios, descritivos e qualiquantitativos.
Inicialmente, é importante contextualizar as principais alterações apresentadas pela Lei 14.133/2021, sendo elas: o princípio da segregação de funções, a inversão das fases (julgamento antes da habilitação) e o sistema de registro de preços (SRP).
No que tange ao princípio da segregação de funções, conforme parágrafo 1º do artigo 7º, da Lei 14.133/2021, evidenciou-se a necessidade de evitar que os mesmos servidores sejam responsáveis por tarefas da fase de preparação/planejamento, da fase competitiva da licitação ou da fase pós celebração do contrato (fiscalização de contratos e apuração de infrações) (BARROS; KUHL, 2024).
Outra novidade da atual lei concerne à celeridade administrativa do processo licitatório, pela inversão das fases, ou seja, é realizado o julgamento da proposta mais vantajosa para, em seguida, verificar os documentos de habilitação do licitante com a proposta mais vantajosa e, caso todos os requisitos sejam preenchidos, declara-se este como vencedor (BARROS; KUHL, 2024).
Prosseguindo, segundo Barros e Kuhl (2024), a Lei 14.133/2021 dedicou uma seção inteira para regulamentar o SRP, sendo esta uma ferramenta estratégica para gestão e otimização das aquisições governamentais. Esse sistema permite fixar um determinado preço para uma determinada quantidade de bens ou serviços comuns, por um período de um ano (prorrogável por igual período), estabelecendo a possibilidade da compra, mas que, caso haja saldo remanescente, o mesmo possa ser remanejado entre os órgãos da administração pública. Também foi regulamentada a possibilidade de uma instituição aderir à construção do processo licitatório de outra, contudo, entes municipais só podem aderir às atas municipais, estaduais ou da União, e entes estaduais só podem aderir às atas estaduais ou da União.
Após contextualização e analisando os artigos captados, observou-se que a Lei de Licitações trouxe inovações e melhorias importantes para as contratações públicas, em especial, à de medicamentos (BARROS; KUHL, 2024). Os avanços observados nos estudos indicam a utilização do arcabouço regulatório fiscal e técnico-sanitário, reforçando à promoção exitosa de ações intersetoriais, mesmo que com a presença do viés da pandemia de covid-19. Todavia, as ações da ANVISA são essenciais para garantir a confiabilidade nos produtos, serviços e empresas fornecedoras, distribuidoras e transportadoras, garantindo o monitoramento da qualidade destes no mercado (LOPES; JESUS, 2024).
Desta forma, é facultada à Administração Pública zelar pela segurança e eficácia dos produtos que adquire, incutindo nos editais de licitação os documentos técnico-sanitários necessários para habilitação das empresas julgadas, respeitando os pareceres técnicos emitidos e garantindo a minimização de riscos à saúde pública (FATEL, 2021).
Ainda que o desabastecimento de medicamentos seja uma constante para o SUS, esta Lei permite minimizar os riscos potenciais da fase interna da licitação, garantindo à Administração Pública o tempo necessário para se adequar e intervir naquilo que está em sua governabilidade, à curto, médio e longo prazo, seja contratando novos fornecedores, estabelecendo consórcios intermunicipais/interestaduais, ampliando o diálogo à acadêmia e até fomentando o Complexo Econômico Industrial da Saúde (BAGATINI; RECHE, 2022).
Por fim, destaca-se que existem algumas limitações no presente trabalho. A principal limitação é o fato de este ser um dos primeiros estudos de revisão de escopo que utiliza primordialmente a Lei 14.133/2021, portanto, o baixo número amostral da presente revisão é um fator que precisa ser considerado. Ainda assim, salienta-se o curto tempo de vida desta Lei, cuja obrigatoriedade regimental foi iniciada em 30 de dezembro de 2023. Além disso, os artigos disponíveis possuem um viés bastante expressivo: a maioria compreendia a pandemia de covid-19, sendo esse um dos períodos de maior gravidade sanitária dos últimos tempos, consequentemente desestabilizando vários fluxos administrativos pré-existentes.

A Lei 14.133/2021 permitiu a execução de uma série de inovações no setor público de Saúde, conferindo transparência e celeridade às contratações públicas de medicamentos. Com seu advento, promoveu-se a etapa de planejamento como pilar fundamental de todo o processo licitatório. Um bom planejamento garante robustez à fase interna do processo, permitindo que seu trâmite processual ocorra sem intercorrências.
Compreende-se que o desabastecimento é um problema crônico, ainda que por fatores externos, como licitações desertas ou licitações fracassadas (preços superiores ao estipulado em pesquisa de mercado, ausência de insumos e/ou interrupção na fabricação), contudo, a Lei 14.133/2021 apresentou estratégias e ferramentas diferentes para agilizar e flexibilizar as licitações, seja pelo SRP ou pela inversão das fases, assim como estabeleceu, de forma clara, a importância de segregação de funções dos servidores públicos no que tange às fases do processo licitatório.
Por mais que exista uma grande limitação amostral, percebe-se uma ótima oportunidade de linha de pesquisa na grande área de Assistência Farmacêutica e que pode trazer consequências práticas importantes ao funcionalismo público.

Principal

Bruno Vieira de Moraes

brunotvierra@gmail.com

Residente no Programa de Residência Multiprofissional em Vigilância Sanitária

Coautores

Carla Patrícia Figueiredo Antunes de Souza

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Todo o Brasil

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Bruno Vieira de Moraes

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