O município do Carmo, cidade de pequeno porte, localizado na região serrana do RJ, é reconhecido por suas práticas exitosas no contexto da Reforma Psiquiátrica Brasileira, cenário do fechamento do Hospital Psiquiátrico Teixeira Brandão e da construção de uma Rede de Atenção Psicossocial diversificada, de base comunitária e territorial de cuidado, de acordo com os preceitos do SUS. São eles: CAPS II; 4 Leitos de Saúde Mental no Hospital Geral; Centro de Convivência; Centro de Referência da Infância e Adolescência, Ambulatório de Saúde mental, 17 Serviços Residenciais Terapêuticos (SRTs), SAMU e cobertura total de Estratégia de Saúde da Família. Os SRTs são estratégias importantes no processo de desinstitucionalização, porque acolhem pessoas egressas de longa internação psiquiátrica, sem vínculos familiares e sociais, que necessitam de suporte para seu processo de construção de autonomia e inclusão social. O cuidador exerce papel fundamental, pois, é o elo entre o usuário, a equipe de saúde e a comunidade. Seu maior desafio é fazer do seu espaço de trabalho um lar, desconstruindo práticas hostis do manicômio e construindo espaços de acolhimento, de expressão singular dos moradores, traçando redes de solidariedade e afeto, despatologizando aspectos da vida, construindo estratégias de empoderamento e protagonismo do sujeito enquanto agente transformador da cidade.
Implantados há 20 anos no município, através da Portaria 106/GM/MS de 11/02/2000, os SRTs surgem como ponto de atenção do componente desinstitucionalização e o cuidador como ferramenta estratégica no processo de desospitalização e reinserção social. São 17 SRTs com 113 moradores, 102 cuidadores (82 mulheres e 20 homens), trabalhando em escala de 12 horas, cada turno com 2 cuidadores, que se revezam nas tarefas domésticas e no acompanhamento terapêutico. As funções do cuidador são diversificadas, desde o auxílio num banho, na escolha da vestimenta, no estímulo a realizar atividades domésticas como arrumar o armário, ir ao mercado, etc. O cuidador acompanha o morador na UBS, CAPS, Centro de Convivência, CRAS, fortalecendo a rede intersetorial de cuidado. Seu maior desafio é ampliar a convivência na cidade, a troca social com a vizinhança, andar pelas calçadas, consumir no comércio local, acessar os serviços e equipamentos, como restaurantes, clubes, lojas, eventos e lazer. Os laços afetivos são construídos no cotidiano, fortalecendo espaços de solidariedade, sentimento de pertencimento, empoderamento e inclusão social. Os cuidadores contam com supervisão e orientação dos técnicos de referência da casa e equipe do CAPS. Oferecemos o Curso de Formação de Cuidadores em parceria com a ETIS, escola do SUS. A AUFASSAMC (Associação de Usuários, Familiares e Amigos dos Serviços de Saúde Mental do Carmo) é responsável pela contratação dos cuidadores.
Em duas décadas de implantação dos SRts, podemos reconhecer o papel preponderante do cuidador na ação exitosa de inclusão social da loucura em Carmo, tornando nossa cidade referência no Processo de Reforma Psiquiátrica, possibilitando a construção de uma existência digna para centenas de pessoas. A construção do cargo cuidador em saúde possibilitou a empregabilidade e sustentabilidade de centenas de famílias carmenses. A renda dos moradores foi um elemento propulsor da economia local, já que os moradores de RT passaram a ser consumidores vorazes da cidade. A cidade se tornou menos hostil e mais acolhedora, reconhecendo o lugar dessas pessoas como cidadãos de direito. Foi possível criar relações de convivência e afeto entre a vizinhança, os comerciantes, os agentes políticos e prestadores de serviços. A comunidade toda ganhou com a vinda dos novos moradores da cidade.
No ano de 2024, que completamos 20 anos de implantação dos SRTs em Carmo e criação do cargo cuidador em saúde, vimos apresentar essa experiência exitosa, que traz como tema central o trabalho estratégico do cuidador como ferramenta fundamental de inclusão social, quando ao nível nacional, começa-se a discutir a elaboração da Política e o Plano Nacional de Cuidados. Reconhecemos a invisibilidade do trabalho do cuidador em nossa sociedade, principalmente, as mulheres cuidadoras, além de atuar no mercado de trabalho, muitas vezes como única fonte de renda das famílias, essas mulheres respondem na maioria das vezes por todos os afazeres domésticos e atividades familiares, como cuidar dos filhos e parentes, numa jornada árdua e cansativa. É preciso reconhecer a dívida social com essa população, criando uma política que dê visibilidade ao trabalho das cuidadoras e cuidadores em saúde. Através da participação social, construir estratégias de sustentação do status de cuidador, com ações intersetoriais, garantindo uma organização social do cuidado mais justa e igualitária A experiência do cuidador em Carmo pode contribuir para o desenvolvimento de ações e estratégias ao nível nacional, assim como inspirar outras experiências no país
RUA CELSO FARIA DE CARRILHO, 458, CARMO, RJ
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