Resumo
Este artigo propõe uma análise crítica e interdisciplinar sobre as manifestações de corrupção interna e violência patrimonial nas estruturas públicas e comunitárias de Santa Cruz Cabrália, com foco especial no sistema de saúde mental (CAPS), nas atividades de extensão do CEJUSC e nas organizações não governamentais envolvidas em projetos sociais e terapêuticos. A partir de uma perspectiva fenomenológica e sistêmica, fundamentada nos autores Bert Hellinger, Jan Jacob Stam, Gunthard Weber e Klaus Grochowiak, investiga-se como os padrões inconscientes e as lealdades ocultas interferem na manutenção da ordem institucional. Apresentam-se os conceitos de “crimes sistêmicos” e “quebras de pertencimento organizacional”, propondo a constelação organizacional como ferramenta de diagnóstico e intervenção, articulada à Terapia Comunitária Integrativa (TCI), à Comunicação Não Violenta (CNV) e às práticas integrativas em saúde. A metodologia parte de relatos de experiência, análise documental e registros fenomenológicos arquivados em plataformas como o FamilySearch. O artigo visa contribuir com novas formas de enfrentamento da corrupção silenciosa, promovendo ambientes organizacionais saudáveis, íntegros e restaurativos.
Palavras-chave
Constelações Organizacionais; Corrupção Sistêmica; Violência Patrimonial; Justiça Restaurativa; Terapia Comunitária Integrativa; CAPS; CEJUSC; Comunicação Não Violenta; Saúde Pública; Sistemas Organizacionais.
Abstract
This article proposes a critical and interdisciplinary analysis of internal corruption and patrimonial violence within public and community structures in Santa Cruz Cabrália, with special focus on the mental health system (CAPS), CEJUSC’s outreach activities, and the non-governmental organizations involved in social and therapeutic projects. From a phenomenological and systemic perspective, grounded in the works of Bert Hellinger, Jan Jacob Stam, Gunthard Weber, and Klaus Grochowiak, the study investigates how unconscious patterns and hidden loyalties interfere with the maintenance of institutional order. It introduces the concepts of “systemic crimes” and “organizational belonging ruptures,” proposing organizational constellations as a diagnostic and intervention tool, articulated with Integrative Community Therapy (ICT), Nonviolent Communication (NVC), and integrative health practices. The methodology is based on experience reports, document analysis, and phenomenological records archived on platforms such as FamilySearch. The article aims to contribute to new ways of confronting silent corruption, promoting healthy, ethical, and restorative organizational environments.
Keywords
Organizational Constellations; Systemic Corruption; Patrimonial Violence; Restorative Justice; Community Integrative Therapy; CAPS; CEJUSC; Nonviolent Communication; Public Health; Organizational Systems.
Introdução
A corrupção é um fenômeno multifacetado que compromete não apenas a eficiência dos sistemas institucionais, mas também a saúde moral e organizacional das estruturas que deveriam servir ao bem comum. Em Santa Cruz Cabrália, as práticas de violência patrimonial, negligência e corrupção em diversos setores da administração pública, especialmente na área da saúde mental e nos projetos ligados à promoção da saúde integral, evidenciam a necessidade de uma abordagem mais profunda e inovadora. Este artigo parte de relatos e experiências vivenciadas pelo autor ao longo de mais de uma década de atuação em políticas públicas, com destaque para os registros realizados no CAPS, n0s registros das atividades do CEJUSC e nas articulações com a Promotoria de Justiça.
A proposta deste trabalho é analisar como os chamados “crimes sistêmicos” e as “quebras de pertencimento organizacional” impactam diretamente na prestação dos serviços públicos, provocando adoecimento coletivo e rupturas nas relações institucionais. A fundamentação teórica baseia-se nas constelações organizacionais propostas por Bert Hellinger e aprofundadas por autores como Jan Jacob Stam, Klaus Grochowiak, Gunthard Weber e Matthias Varga von Kibéd. Ao lado dessas ferramentas sistêmicas, propõe-se também a integração da Terapia Comunitária Integrativa (Barreto) e da Comunicação Não Violenta (Rosenberg) como tecnologias sociais de reparação e prevenção de conflitos.
Este estudo visa, portanto, contribuir para a construção de modelos restaurativos e participativos de gestão pública, em que as práticas integrativas em saúde sejam reconhecidas não apenas como complemento terapêutico, mas como ferramentas de enfrentamento à corrupção estrutural e à violência institucional.
1. Fundamentação Teórica
1.1 Crimes sistêmicos e organizações adoecidas
A ideia de “crimes sistêmicos” surge a partir da compreensão de que certos comportamentos corruptos não são apenas individuais, mas expressam lealdades inconscientes a padrões disfuncionais de um sistema organizacional. Stam (2015) descreve como empresas e instituições públicas podem repetir padrões de exclusão, inversão hierárquica e desequilíbrio no dar e receber. Varga von Kibéd e Grochowiak (2006) apontam que o adoecimento institucional ocorre quando há ocultamento de verdades essenciais, não reconhecimento de contribuições passadas e descontinuidade na memória organizacional.
1.2 Constelações Organizacionais: teoria e aplicações
As constelações organizacionais são uma metodologia de diagnóstico e intervenção sistêmica aplicada a contextos institucionais. Hellinger (2001) foi o primeiro a descrever a transferência dos princípios das constelações familiares para o contexto organizacional. Stam (2018) e Weber (2005) mostram como é possível observar dinâmicas ocultas em grupos, como exclusões de antigos colaboradores, rompimentos abruptos com gestões anteriores e repetição de padrões destrutivos. A constelação permite que o sistema seja “visto” em sua totalidade e que caminhos de restauração sejam revelados.
1.3 TCI, CNV e Práticas Integrativas como tecnologias restaurativas
A Terapia Comunitária Integrativa (Barreto, 2008) e a Comunicação Não Violenta (Rosenberg, 2006) têm se consolidado como tecnologias sociais eficazes para a promoção do cuidado coletivo, prevenção de conflitos e fortalecimento dos vínculos comunitários. Integradas às PICS no SUS, essas práticas têm mostrado potencial para restaurar relações adoecidas, dar voz a excluídos institucionais e facilitar a escuta empática nos espaços de gestão e participação social.
Metodologia
Este estudo é caracterizado como uma pesquisa qualitativa, de natureza exploratória e descritiva, com abordagem crítica e fenomenológica. Trata-se de um relato de experiência fundamentado em vivências diretas no município de Santa Cruz Cabrália, no estado da Bahia, no período de 2009 a 2025. As evidências aqui relatadas foram coletadas a partir de documentos institucionais, registros pessoais, registros de reuniões, denúncias formais e relatos testemunhais, incluindo material fotográfico e registros de prontuários clínicos que foram adulterados, extraviados ou omitidos dos sistemas oficiais de informação.
A pesquisa adota uma perspectiva sistêmica, fundamentada nas Constelações Organizacionais segundo Jan Jacob Stam e outros autores consagrados como Bert Hellinger e Gunthard Weber, buscando identificar e interpretar os padrões ocultos de desordem institucional, corrupção sistêmica, negligência profissional e quebra das ordens do pertencimento, da hierarquia e do equilíbrio.
Para além da observação participante, utilizou-se também como ferramenta metodológica a triangulação entre diferentes fontes de dados: relatos de campo, experiências práticas desenvolvidas no CEJUSC/Npics Cabrália, bem como as práticas integrativas em saúde aplicadas no contexto psicossocial e comunitário. A análise foi enriquecida com os referenciais da Comunicação Não Violenta (Rosenberg) e da Terapia Comunitária Integrativa (Barreto), articulando os dados empíricos com as diretrizes da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC-SUS).
Os nomes e identificações de pessoas físicas foram preservados ou alterados para fins éticos. Este estudo não visa acusar indivíduos, mas denunciar padrões sistemicamente repetitivos que, se não reconhecidos, continuarão a comprometer a integridade das políticas públicas e a dignidade dos sujeitos envolvidos.
Resultados e Discussão
Os dados levantados ao longo de quase duas décadas de atuação em Santa Cruz Cabrália revelam um padrão persistente de desorganização institucional, apagamento de iniciativas inovadoras, sabotagem de políticas públicas e reprodução de violências simbólicas, patrimoniais e epistemológicas nos serviços de saúde e em organizações comunitárias. Tais manifestações não ocorrem de maneira aleatória, mas configuram-se como expressões de um campo sistêmico adoecido, alimentado por omissões, negação da realidade e desrespeito às ordens fundamentais descritas por Hellinger: pertencimento, hierarquia e equilíbrio.
Violência Patrimonial Institucional
Entre os episódios mais graves, destaca-se a destruição ou ocultação deliberada de prontuários e livros de registro que documentavam atividades de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), a exemplo dos Livros de práticas comnunicativas e expressivas dos pacientes e da massagem clássica no Caps, os registros das atividades do Nasf e Caps de imposição de mãos, auriculoterapia, constelações familiares e florais de Bach. Tais registros, desenvolvidos dentro de projetos em parceria com a Unesulbahia, professores universitários e terapeutas populares, foram sistematicamente extraviados após férias ou afastamentos do autor, comprometendo a memória institucional e a rastreabilidade das ações.
Além disso, a não inserção dessas atividades nos sistemas de informação do SUS (como o e-SUS AB) impediu que as equipes fossem creditadas oficialmente, inviabilizando o reconhecimento dos resultados, a captação de recursos e a consolidação de políticas de saúde integrativa. Essa invisibilização constitui uma forma de violência patrimonial e simbólica contra o saber popular e contra a saúde coletiva.
Corrupção Sistêmica e Quebra de Confiança Pública
Observou-se um padrão de corrupção institucionalizada, operando não apenas nas esferas administrativas da prefeitura, mas também em organizações sociais e até em espaços que se propunham a atuar em defesa da cidadania. Recursos de projetos públicos, como o investimento de R$ 50 mil do programa de Terapia Comunitária Integrativa Indígena articulado com a UFBA e o professor Ubiraci Pataxó, foram desviados ou jamais utilizados conforme o escopo original, impedindo a formação de terapeutas indígenas e a ampliação do cuidado nas unidades de saúde da família.
Essas quebras de confiança comprometem a possibilidade de reconstrução institucional, pois ferem não apenas a legalidade, mas os vínculos simbólicos que sustentam o pertencimento comunitário. O trauma organizacional gerado por tais episódios produz afastamentos, desistências e adoecimento psíquico dos trabalhadores do SUS e de seus colaboradores voluntários, perpetuando um ciclo de abandono e desmobilização.
Constelações Organizacionais como Ferramenta de Diagnóstico Sistêmico
A análise sob o enfoque das Constelações Organizacionais permite compreender que os conflitos institucionais não se resumem à má gestão individual, mas são frequentemente reflexo de ordens ocultas violadas no sistema organizacional. A ausência de reconhecimento aos fundadores de projetos, a negação de contribuições voluntárias, o apagamento da história institucional e a falta de reparação a vítimas de negligência revelam crimes sistêmicos, que desestabilizam o campo e produzem lealdades invisíveis à desordem, como bem aponta Jan Jacob Stam.
Diante disso, é necessário incluir nas estratégias de fortalecimento do SUS e das políticas públicas comunitárias práticas como as constelações organizacionais e familiares, a terapia comunitária integrativa e a comunicação não violenta, como caminhos restaurativos para resgatar os vínculos rompidos, reconstituir a confiança e permitir que as instituições voltem a servir à sua missão original.
Considerações Finais
A análise crítica dos acontecimentos ocorridos em Santa Cruz Cabrália entre 2009 e 2024 evidencia um fenômeno mais profundo do que a simples má gestão pública: trata-se de um adoecimento sistêmico institucional, que rompe com as bases do pertencimento, da hierarquia funcional e do equilíbrio entre dar e receber. O desaparecimento de livros, prontuários, recursos materiais e até mesmo alimentos em setores vulneráveis como o CAPS não são falhas isoladas, mas expressões sintomáticas de desestruturações organizacionais, que necessitam ser enfrentadas com metodologias que vão além da auditoria técnica e da punição formal.
Neste contexto, as Constelações Organizacionais, tal como propostas por Jan Jacob Stam, Gunthard Weber, e aprofundadas no Brasil por autores como Sabrina Baldin e Maurício Valadares, emergem como ferramentas indispensáveis para diagnosticar, visualizar e restaurar ordens sistêmicas em instituições públicas e comunitárias. Elas tornam visíveis os emaranhamentos ocultos que mantêm padrões de sabotagem, omissão e autoboicote, permitindo intervenções mais profundas e sustentáveis.
Aliadas à Terapia Comunitária Integrativa (TCI) — desenvolvida por Adalberto Barreto — e à Comunicação Não Violenta (CNV) de Marshall Rosenberg, essas abordagens integram um modelo restaurativo para reorganizar a cultura institucional, promovendo ambientes de escuta, acolhimento, corresponsabilização e resgate do sentido coletivo de missão.
A experiência em Santa Cruz Cabrália mostra que não basta implementar projetos; é preciso cuidar dos vínculos, honrar as histórias e reconhecer os excluídos, sejam eles pacientes, terapeutas, voluntários ou povos indígenas. Onde há exclusão, haverá repetição do trauma. Onde há reparação, há possibilidade de nova ordem. Que este artigo sirva como um marco para inaugurar uma nova etapa no SUS e nas políticas públicas: uma etapa pautada na verdade, na justiça restaurativa e no amor que organiza os sistemas.
Referências
BARRETO, Adalberto. Terapia Comunitária Integrativa: passo a passo. Fortaleza: Gráfica LCR, 2008.
GROCHOWIAK, Klaus; VARGA VON KIBÉD, Matthias. Coaching com Constelações Sistêmicas: aplicando as ordens do amor no coaching organizacional. São Paulo: Cultrix, 2006.
HELLINGER, Bert. Constelações Organizacionais: o sucesso nas empresas tem alma. São Paulo: Atman, 2001.
ROSENBERG, Marshall B. Comunicação Não-Violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais. São Paulo: Ágora, 2006.
STAM, Jan Jacob. O que move as organizações: constelações organizacionais e os caminhos da liderança. São Paulo: Ágora, 2015.
STAM, Jan Jacob. Organizações Vivas: práticas e experiências com constelações organizacionais. São Paulo: Atman, 2018.
WEBER, Gunthard. Constelações organizacionais: como as constelações familiares podem ajudar na solução de problemas nas organizações. São Paulo: Atman, 2005.
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