No Brasil pontua-se a presença de forte discriminação em relação a algumas populações chaves (gays, homens que fazem sexo com homens – HSH, transexuais, profissionais do sexo) nos serviços de saúde, seja por falta de capacitação ou por questões pessoais dos profissionais de saúde, como preconceito e inaptidão para atender esta população.
A desigualdade social, estigmatização e discriminação são fatores que produz uma maior vulnerabilidade destas populações, dificultando o acesso à prevenção, tratamento e serviços da saúde ligados ao HIV.
A Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) ao HIV é um novo método de prevenção à infecção pelo HIV, implementada no SUS no final de 2018. Consiste na tomada diária de um comprimido que permite ao organismo estar preparado para enfrentar um possível contato com o HIV, ou seja, o indivíduo se prepara antes de ter uma relação sexual de risco para o HIV. Este medicamento impede que a pessoa contraia o vírus em caso de uma relação sexual desprotegida ou caso ocorra o rompimento do preservativo.
A divulgação, oferta e ampliação da PrEP às populações vulneráveis faz-se urgente para dar uma opção a mais de escolha de prevenção aos indivíduos em situação de risco de contaminação pelo HIV.
A partir deste contexto, o projeto teve a intenção de ampliar o acesso à essa nova tecnologia de prevenção de forma desburocratizada, tendo como objetivos:
– Ofertar a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV para a população vulnerável fora dos serviços de saúde, em local de convivência e de fácil acesso para estes usuários;
– Vincular o usuário aos serviços de saúde, onde ele terá consultas e exames regulares e ofertando tratamento oportuno para alguma Infecção Sexualmente Transmissível que possa vir a ser diagnosticada;
– Distribuição de insumos de prevenção (preservativos internos, externos e gel lubrificante), bem como autotestes de HIV aos pacientes, ampliando a alternativa de diagnóstico entre os pares.
Muitos usuários desconhecem os meios para ter acesso à PrEP, não sabendo qual serviço de saúde devem acessar, além de terem muita falta de esclarecimento sobre o medicamento, informações erradas sobre efeitos colaterais, etc. Assim, o projeto nasceu dessa necessidade de facilitar o primeiro acesso à PrEP, levando esta tecnologia para fora dos serviços de saúde, de forma descomplicada, em um ambiente acolhedor e de fácil acesso, onde a divulgação das datas das consultas foi realizada em sites governamentais e redes sociais de diversas parcerias, como Instagram da Parada LGBT de Goiás, ONG Fórum de Transexuais, blogueiros, saunas gays e pelos próprios usuários de PrEP. O intuito foi ofertar este primeiro atendimento de forma desburocratizada e, após a primeira consulta, fazer a vinculação destas pessoas ao serviço de saúde para a continuação da profilaxia.
Para que o projeto pudesse ser factível, a Coordenação Estadual de Assistência IST/Aids de Goiás (idealizadora do projeto), firmou parceria com o Centro de Referência em Diagnóstico Terapêutico – CRDT da Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia com sua equipe multiprofissional extremamente capacitada no tema e também com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos, que cedeu o espaço onde aconteceriam as consultas.
No dia da consulta, a pessoa realizava os testes rápidos para HIV, Sífilis, Hepatites B e C, além de receberem preservativos, gel lubrificante e autotestes de HIV que podiam ser levados para outras pessoas do seu convívio. Após os testes, eram realizadas consultas com enfermeira, psicóloga e farmacêuticos do Centro de Referência, onde era dada toda a explicação sobre a profilaxia e o paciente já saía com 1 frasco de comprimido para 30 dias. Entre a data desta primeira consulta e o retorno para 30 dias, a pessoa recebia os pedidos de exames complementares para serem feitos no SUS. A consulta de retorno já iria acontecer no Centro de Referência em Diagnóstico Terapêutico – CRDT, finalizando assim a vinculação deste paciente à unidade de saúde de forma gradual e desburocratizada.
Com a divulgação do projeto em redes sociais de vários parceiros e pelos próprios usuários da PrEP, a cada mês haviam um aumento dos interessados em aderir à profilaxia. Com a escuta destes usuários, a Coordenação Estadual começou a identificar falhas institucionais e formou laços mais estreitos com as Organizações da Sociedade Civil, começou a participar em todas as Paradas de Orgulho LGBTQIAPN+, iniciou uma rota mensal de entrega de preservativos em áreas de prostituição, camelódromos, universidades, centro de apoio à populações de rua, saunas e boates voltadas ao público LGBTQIAPN+.
A Coordenação estadual de IST também viu a necessidade de ampliar as capacitações em PrEP para servidores da saúde, realizando ao longo do ano seis capacitações em diversas regiões do estado, enfatizando a importância da identificação dos possíveis usuários de PrEP, o correto acolhimento e atendimento livre de discriminação, com o intuito de combater o estigma.
De março a dezembro de 2023 foram atendidas 60 pessoas, sendo realizados 245 testes rápidos. Foram distribuídos 300 autotestes de HIV e centenas de insumos de prevenção.
Com o projeto, tivemos acesso ao olhar do usuário podendo, a partir de sua escuta, melhorar a gestão da prevenção. Somente através de suas angústias quanto ao atendimento, podemos realizar capacitações em PrEP visando, além do conhecimento técnico, melhorar o acolhimento desses usuários de forma livre de preconceito por parte dos profissionais de saúde.
Com as parcerias firmadas, a gestão estadual passou a se tornar mais próxima das Organizações da Sociedade Civil, participando mais ativamente dos eventos voltados ao público LGBTQIAPN+ e estando mais atenta aos seus anseios e desafios.
Já foi consolidado por pesquisas que nos locais onde a PrEP é ampliada, o número de casos de HIV é reduzido. A iniciativa deste projeto era ampliar a oferta da PrEP na população mais afetada, de forma desburocratizada, como forma de evitar novas contaminações principalmente na população jovem. A partir da experiência pudemos notar a urgência de ampliação de serviços que ofertam a profilaxia e no aumento de Unidades Dispensadoras de Medicamentos, de forma a deixar a rede ampliada e de fácil acesso aos usuários do interior do estado, uma vez que a maioria dos serviços se concentram em grandes cidades, deixando os moradores de cidades menores sem acesso a essa tecnologia pela dificuldade de acesso. Foi notado também a necessidade de capacitar os profissionais de saúde em atender as pessoas que buscam a PrEP sem julgamentos ou discriminação, uma vez que esta é uma das maiores barreiras de acesso principalmente à população jovem que se sente discriminada quando o assunto é relacionado à prevenção ou Infecções sexualmente transmissíveis.
Com o projeto, alguns serviços de testagem do Estado se mostraram interessados em desenvolver formas de ampliar a oferta da PrEP em ações extra-muros, uma vez que já possuem a equipe técnica capacitada.
Para a ampliação da oferta da PrEP, as Secretarias Municipais de Saúde devem ampliar o número de Unidades Dispensadoras de Medicamentos (UDM), realizar a capacitação dos profissionais e ampliar a divulgação deste método de prevenção ao HIV.
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