Barreirinha localiza-se na região do Baixo-Amazonas, com população em 2024 de 33.919 hab. O território é formado pela diversidade na fauna e flora, além dos traços de multiculturalidade, possuindo povos originários da etnia Sateré-Mawé, povos tradicionais como ribeirinhos e pescadores, e grupos de nordestinos, japonese e negros.
A Fundação Cultural Palmares em 2013 reconheceu o território do Rio Andirá como remanescentes de Quilombo, sendo formada por 06 comunidades. Segundo o Censo de 2022, essa área é o quilombo mais populoso do Amazonas com 1.141 pessoas e 276 famílias.
Relatar as ações e estratégias que visaram fortalecer o vínculo entre a comunidade quilombola e a Unidade Básica de Saúde e sua equipe de profissionais, ressaltando a importância da valorização da cultura quilombola.
Foram realizadas ações para reforçar a relação recíproca que deve existir entre os profissionais e os usuários, além da confluência entre conhecimento científico e saberes populares.
Ocorreram rodas de conversas com as lideranças comunitárias, possibilitando o diálogo e amplificando a voz em espaços de saúde, antes ainda não inseridos de forma ativa. Aconteceram palestras e rodas de conversa sobre o uso de ervas medicinais e a relação com os métodos científicos de tratamento e reabilitação.
Ao realizar o dia D da vacinação, enquanto aguardavam serem chamados, as crianças participavam de oficinas sobre a imunização e a valorização da cultura negra, como a criação do mascote Zé Quilombinho.
Outra estratégia, foi a busca da representatividade na equipe com a contratação de profissionais negros ou remanescentes de quilombo. A UBS expandiu seu horário de atendimento, funcionando em horários noturnos ou aos fins de semana, para que as famílias que estão nos centros (terrenos de plantio e colheita) durante o dia, possam ser atendidas, já que dependem das atividades de subsistência.
A Equipe de saúde ajudou a realizar a Semana da Cultura Negra, na qual, o quilombo resgata as diversas manifestações e heranças culturais como a dança do Lodum, Carimbó, Siriá, capoeira e a brincadeira da Onça te Pega. Os Agentes Comunitários de Saúde foram capacitados para que nas visitas domiciliares ressaltassem os serviços da UBS e a importância no cadastro do autorreconhecimento como negro/quilombola.
Para a cobertura de saúde foi inserida no quilombo uma Unidade Básica de Saúde. Entretanto, em 2024, foi observado que a comunidade apresentava pouca procura por atendimento ou resistência aos serviços, sendo vislumbrado baixa adesão as programações e pouco envolvimento nas ações, além de problemática nos indicadores vacinais.
Assim, foi observado que ainda existia a crença no misticismo como cura, sendo usado “rezador”, e as ervas medicinais. Outro fator, era a dificuldade de ir a UBS devido as atividades de subsistência. Também existia pouca adesão a vacinação, devido a disseminação de Fake News. Outro ponto, era a não representatividade na equipe de profissionais.
Assim, era necessário desenvolver estratégias e ações para o fortalecimento de vínculo com a comunidade, ressaltando a importância da UBS para a prevenção e assistência, além de respeitar os saberes populares, crenças e cotidiano dessa população.
A partir das dificuldades observadas foi definido estratégias para a reorganização dos processos de trabalho, e a necessidade da melhoria no gerenciamento de recursos, insumo, da equipe e gestão.
Assim, antes das intervenções segundo o Relatório de Atendimento Individual do E-SUS APS um fluxo de atendimentos na Unidade baixo, sendo em 2023 a média de 89 atendimentos/mensais, e após as ações passou para 121 atendimentos/mensais em 2024. Em relação aos procedimentos, segundo o Relatório de Procedimentos Consolidados em 2023 foram realizados 3.478, já em 2024 saltou para 4.768.
Em relação a promoção em saúde alinhado com a valorização cultural e o autorreconhecimento, segundo o Relatório de Cadastro Individual, os usuários que se identificavam com a raça ou cor negro/quilombola passaram de 1.179 em 2023, para 1.324 cadastros em 2024.
Sobre a vacinação de menores de 01 ano com Poliomielite e Pentavalente, em 2023 apenas 85% das crianças tinham sido vacinadas, já 2024 a cobertura ficou em 100%.
Os resultados foram quantitativos como o aumento nos atendimentos, melhora nos indicadores vacinais e os cadastros do autorreconhecimento como negro/quilombola. Vale ressaltar também os resultados qualitativos, sendo visíveis no aumento na participação de saúde e das atividades que visam a troca de saberes, o resgate e a valorização da própria cultura.
O usuário se empodera criando autonomia e consciência crítica do contexto inserido, legitimando suas lutas e transformações sociais e culturais.
Esse projeto tem relevância, pois é uma construção coletiva que reflete a realidade do território e suas relações. Na Amazônia profunda os saberes populares se misturam, mas a falta de conhecimento e a discriminação dificultam que esse povo tenha o direito preservado do acesso aos serviços de saúde.
O Projeto visou de início o fortalecimento de vínculos, mas suas ações e resultados transcenderam as esferas da saúde e mostrou que a diversidade de saberes em um espaço de diálogo contribui para o bem-estar do indivíduo inserido em um contexto cultural.
Assim, faz-se necessário garantir Políticas Públicas e possibilitar serviços de saúde para o povo quilombola, sendo uma população socioeconomicamente vulnerável e historicamente esquecida ou não reconhecida no contexto amazônico.
É inegável a presença das raízes da cultura quilombola e negra. Dessa forma, são necessários mais pesquisas e estudos que exaltem a presença dessa população, com direitos assegurados e respeitados como negritude Amazônica.
As ações podem ser utilizadas em diversos povos tradicionais na região Amazônica, mas para isso é preciso entender a dinâmica da “Amazônia Humana”, respeitando a relação recíproca entre o conhecimento científico e os saberes populares.
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