Escuta e pertencimento: o cuidado multiprofissional em comunidades tradicionais de Laranjal do Jari

Laranjal do Jari, no sul do Amapá, é um município que pulsa em meio à floresta amazônica e guarda, em suas margens e trilhas, uma diversidade de modos de vida e resistência. Com uma população total estimada em 52 mil habitantes, cerca de 8 mil pessoas vivem fora do perímetro urbano, distribuídas em comunidades tradicionais ribeirinhas, quilombolas, extrativistas e rurais. Nesse território, destacam-se a Comunidade da Padaria, a Reserva Extrativista do Iratapuru, o Distrito de Água Branca do Cajari e outras 18 comunidades adjacentes, que enfrentam desafios históricos de acesso à saúde.
O processo de organização do cuidado nessas comunidades iniciou no primeiro semestre de 2023, impulsionado pela participação do município no “Projeto Residências”, fruto de parceria entre o PROADI-SUS e o Hospital Sírio-Libanês, com foco em populações vulnerabilizadas. Essa parceria possibilitou reflexões, escutas ampliadas e maior sensibilização dos profissionais quanto à complexidade e importância do cuidado em territórios tradicionais.
Diante disso, a Secretaria Municipal de Saúde estruturou uma experiência voltada à reordenação da atenção primária nesses territórios, com foco na atuação multiprofissional integrada, humanizada e culturalmente sensível. A estratégia não apenas levou atendimentos até as comunidades, mas transformou a lógica de cuidado: com escuta, vínculo e planejamento coletivo, a equipe passou a navegar junto com a vida desses povos, respeitando seus saberes e suas rotinas.

Objetivo geral:
Organizar o cuidado em saúde junto às comunidades tradicionais de Laranjal do Jari por meio de ações multiprofissionais contínuas, fortalecendo a presença da Atenção Primária nos territórios.

Objetivos específicos:
– Realizar escutas ativas junto às lideranças comunitárias para diagnóstico participativo.
– Promover ações itinerantes e interdisciplinares de cuidado em saúde adaptadas à realidade amazônica.
– Estimular o pertencimento e a corresponsabilização entre profissionais e comunidade.
– Monitorar indicadores e replanejar estratégias conforme demandas locais.

A estratégia foi construída com base em três pilares: escuta, territorialidade e trabalho multiprofissional. Iniciou-se com o mapeamento participativo das comunidades, com apoio dos ACS e lideranças locais. O diagnóstico levou em conta dados do território, rotinas de trabalho da população (como a extração de castanha, pesca e garimpo) e os ciclos naturais da região.
Com base nesse levantamento, a equipe multiprofissional — composta por médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, dentistas, psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, ACS e agentes de saúde bucal — passou a planejar ações regulares e integradas, com foco em saúde da mulher, puericultura, doenças crônicas, saúde mental, práticas integrativas e educação em saúde.
As atividades incluem consultas compartilhadas, rodas de conversa, visitas domiciliares, oficinas educativas e atendimentos individuais e coletivos. Todo o processo é registrado em prontuário eletrônico (e-SUS APS), com monitoramento de indicadores-chave. A experiência valoriza a horizontalidade, promovendo a escuta e o cuidado com base no respeito e no vínculo.

A presença regular da equipe multiprofissional nas comunidades tradicionais gerou impactos positivos na resolutividade da APS no território. Destacam-se:
– Aumento de 45% nas visitas domiciliares realizadas entre 2023 e 2025 nas comunidades mapeadas.
– Redução de encaminhamentos desnecessários para a média complexidade, com maior resolutividade local.
– Melhoria nos indicadores de pré-natal, especialmente no número de gestantes com pelo menos seis consultas e início precoce do acompanhamento.
– Fortalecimento do vínculo comunitário, com maior adesão às ações e aumento da confiança no serviço público de saúde.
– Adaptação das ações de cuidado à lógica comunitária, com valorização dos saberes tradicionais, dos ciclos da floresta e da organização social das comunidades.

A experiência evidencia que a presença ativa de equipes multiprofissionais, aliada ao planejamento territorializado e à escuta qualificada, é capaz de reorganizar o cuidado na APS em territórios de alta vulnerabilidade e difícil acesso. Ao navegar os rios e caminhos amazônicos com sensibilidade e compromisso, a equipe de Laranjal do Jari transformou a relação entre o SUS e os povos tradicionais, fortalecendo o pertencimento e a corresponsabilidade, e promovendo a equidade.
Essa estratégia pode e deve ser replicada em outros territórios amazônicos, respeitando as singularidades locais e apostando na potência do cuidado em rede. Mais do que chegar às comunidades, trata-se de permanecer presente nelas — com cuidado contínuo, resolutivo e culturalmente sensível.

autor Principal

José Robson Casé da Rocha

jrobsoncase@gmail.com

Médico da ESF

Coautores

José Robson Casé da Rocha, Regiane Cardozo Souza, Vera Cristina Da Costa Miranda, Camila Lobato Vieira, Auriene Silva Melo

A prática foi aplicada em

Laranjal do Jari

Amapá

Norte

Esta prática está vinculada a

Rua Tiradentes - Agreste, Laranjal do Jari - AP, Brasil

Uma organização do tipo

Instituição Pública

Foi cadastrada por

José Robson Casé da Rocha

Conta vinculada

08 abr 2025

CADASTRO

08 abr 2025

ATUALIZAÇÃO

02 maio 2023

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