Atendimento odontológico em comunidades ribeirinhas de difícil acesso do município de Anori-AM: um relato de experiência

INTRODUÇÃO
Observada a necessidade de enfrentar as desigualdades regionais e socioeconômicas no acesso aos serviços de saúde bucal no Brasil, especialmente na região Norte, e tendo em vista que, as comunidades ribeirinhas, em particular, enfrentam sérias dificuldades de acesso devido às suas localizações remotas e à falta de infraestrutura adequada, a Prefeitura Municipal de Anori, junto com a Secretaria Municipal de Saúde, uniu-se em uma força-tarefa no período de 07 á 15 de Maio de 2024, com o objetivo principal de proporcionar acesso à saúde bucal para as comunidades ribeirinhas do município. A equipe de saúde composta por uma Cirurgiã-Dentista, uma ASB e outros profissionais, saíram em missão para levar atendimentos em saúde bucal às oito comunidades ribeirinhas da região do Ayapuá, sendo elas: Arpaúba, Nova Jerusalém, Maués, Pinheiros, Uxi, Uauaçu, Laranjal, e por último, Cuianã não pertencente a região do Ayapuá, mas que também estava no cronograma para os atendimentos.
A experiência realizada se justifica pela necessidade de enfrentar as desigualdades regionais e socioeconômicas no acesso aos serviços de saúde bucal no Brasil, especialmente na região Norte. Conforme destacado na Política Nacional de Saúde, embora o princípio da “Universalidade” seja preconizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a realidade mostra que o acesso ainda é restrito, com disparidades significativas entre diferentes áreas do país. A implementação de ações como atendimento fluvial ou móvel é uma resposta direta às diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal, buscando ampliar o alcance dos serviços e melhorar a qualidade de vida dessas populações vulneráveis.
OBJETIVOS
Levar o primeiro atendimento odontológico programado ás oito comunidades ribeirinhas do município de Anori, no interior do Amazonas. Para alcançar esse propósito, foram realizados os seguintes objetivos específicos: verificar a necessidade de atendimento para essas comunidades, entender as dificuldades e desafios enfrentados nesses atendimentos, e promover educação em saúde bucal para essa população, visando reduzir as barreiras de acesso aos serviços de saúde.

RELATO DE EXPERIÊNCIA
Foram nove dias de atendimentos odontológicos para essas comunidades que anteriormente eram desassistidas por dentistas, tendo que se deslocar para outras localidades à procura de atendimentos que muitas vezes não eram eficazes, seja pela falta de profissionais, barreiras geográficas que dificultavam o acesso, ou falta de insumos.
É sabido que, ao lidar com comunidades ribeirinhas, existem alguns fatores que dificultam ainda mais o acesso, como períodos de cheia ou seca dos rios, locais onde grandes barcos, comumente utilizados em atendimentos fluviais, não conseguem alcançar devido a rios estreitos e não tão profundos, deixando essas comunidades sem acesso aos serviços. Isso resulta em uma alta incidência de doenças bucais nessas comunidades, tornando-as cada vez mais vulneráveis. Além disso, sabe-se que o atendimento odontológico, em qualquer contexto, demanda uma logística muito bem planejada, especialmente quando realizado em comunidades ribeirinhas ou indígenas, seja em barcos ou flutuantes, onde tudo precisa ser meticulosamente organizado para garantir um atendimento de qualidade que respeite a integridade física dos pacientes e priorize a biossegurança.
Nesse contexto, uma Cirurgiã-Dentista e uma ASB foram designadas como responsáveis pelos atendimentos odontológicos. A ASB era encarregada de registrar os pacientes e organizar o ambiente para a atuação da Dentista em cada comunidade. É importante destacar que nem todos os pacientes estavam cadastrados no SUS, mas todos que necessitaram de atendimentos foram bem assistidos.
Foram utilizados cerca de 50 kits de extrações e 50 kits de Curetas de Gracy para as raspagens, além dos kits clínicos utilizados nos exames intraorais, sendo que todos os instrumentais foram devidamente higienizados com sabonete enzimático e esterilizados em uma autoclave portátil, alimentada pelos cabos de energia do barco. Os atendimentos foram realizados com os recursos disponíveis nas circunstâncias locais, em comunidades que não tinham acesso prévio a Dentistas. Os pacientes buscavam atendimento onde o barco parava, frequentemente apresentando dentes severamente danificados pela cárie, resultando em dor e perda dentária.
Os procedimentos ocorriam em cadeiras na proa dos barcos, nas portas dos flutuantes e até mesmo sob árvores, garantindo o acesso aos serviços de saúde necessários. Não foram distribuídas fichas para os atendimentos; estes ocorreram de forma espontânea, visando atender o maior número possível de pacientes no local, minimizando assim o deslocamento dessa população para outras localidades distantes.

RESULTADOS
Durante os nove dias de atendimentos, aproximadamente 150 procedimentos foram realizados, incluindo extrações dentárias, raspagens subgengivais e supragengivais, aplicação tópica de flúor, prescrição de medicamentos e orientações em saúde bucal para gestantes. Adicionalmente, todas as crianças das comunidades receberam palestras sobre escovação e aplicação de flúor. Em uma situação emergencial, uma criança de 02 anos foi encaminhada pela nossa equipe ao município mais próximo para atendimento hospitalar, devido a um abcesso dento-alveolar, trismo, dificuldades alimentares e febre, ocorrido em meio à floresta. Atualmente, os comunitários mostraram-se mais engajados nas ações de saúde bucal que são realizadas nas comunidades, as crianças tornaram-se mais receptivas ao tratamento odontológico, e houve maior aderência ao pré-natal odontológico.
Diante de todas as dificuldades enfrentadas para proporcionar saúde a essas localidades, fica clara a necessidade urgente de uma atuação mais eficaz dos serviços de saúde nessas comunidades. Como resposta a essa demanda, atualmente Anori conta com equipes de saúde bucal que se deslocam quinzenalmente por meio do barco de saúde ou através da UBS Fluvial do município, e está em processo de criação de uma Unidade Básica de Saúde em uma das comunidades, que servirá como polo central para atender às necessidades das demais comunidades ribeirinhas.

CONCLUSÃO
Essa experiência exitosa proporcionou a ampliação dos serviços de saúde bucal para as comunidades ribeirinhas de difícil acesso do município de Anori, levando educação em saúde bucal, procedimentos odontológicos importantes e aderência ao pré-natal odontológico através de estratégias de enfrentamento que garantem a oportunidade de acesso aos serviços de saúde bucal proporcionando á essa população o direito a saúde.
O dentista, especialmente se atua na saúde pública, deve estar preparado para oferecer atendimento adequado a esse público, respeitando sua interculturalidade, experiências e crenças. O atendimento de qualidade aos ribeirinhos é alcançado através do respeito e do diálogo contínuo. É fundamental que os comunitários de todas as localidades tenham acesso aos serviços de saúde, respeitando os princípios que regem o nosso Sistema Único de Saúde (SUS).
Diante do exposto a lição que fica para aqueles que desejam perpetuar essas praticas é que sejam profissionais além das barreiras de um consultório, que seja um profissional capaz de enxergar um problema e encontrar uma ideia, uma solução capaz de amenizar e mudar a realidade de muitos ribeirinhos marginalizados. Que a equidade seja um forte ponto de partida e que os poderes públicos invistam cada vez mais em infraestrutura adequada para reduzir as barreiras de acesso aos serviços de saúde, garantindo assim o direito á saúde de qualidade á quem mais precisa.

autor Principal

CLEIDIANE GAMA PEREIRA

anneodonto20@gmail.com

CIRURGIÂ-DENTISTA

Coautores

Autora: Cleidiane Gama Pereira - Cirurgiã-Dentista SEMSA Anori Co-autor: Pedro Henrique Duarte França de Castro - Doutorando - PPGO UFAM

A prática foi aplicada em

Anori

Amazonas

Norte

Esta prática está vinculada a

Rua Capitão Pedro Silva, 74 - Centro, Anori - AM, Brasil

Uma organização do tipo

Instituição Pública

Foi cadastrada por

CLEIDIANE GAMA PEREIRA

Conta vinculada

05 ago 2025

CADASTRO

05 ago 2025

ATUALIZAÇÃO

Condição da prática

Concluída

Situação da Prática

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