A experiência descrita foi desenvolvida no âmbito do Mestrado Profissional em Saúde da Família (PROFSAÚDE/UFAL), como parte das atividades da disciplina de Promoção da Saúde. O cenário da intervenção foi a Unidade Básica de Saúde (UBS) Teotônio Vilela, localizada no município de Arapiraca, Alagoas, que atende uma população de aproximadamente 3.597 pessoas, distribuídas em sete microáreas sob responsabilidade de uma equipe da Estratégia Saúde da Família (ESF).
A proposta teve como objetivo central promover uma leitura participativa do território com base na cartografia social, em articulação com os princípios da educação popular em saúde. A partir dessa construção, buscou-se elaborar coletivamente uma intervenção voltada à promoção da saúde, com foco no fortalecimento de vínculos, na valorização de saberes locais e na dinamização das redes de cuidado existentes no território.
A justificativa da ação parte do reconhecimento de que o cuidado em saúde ultrapassa os limites das instituições formais, estando profundamente relacionado aos modos de vida, aos afetos e às práticas cotidianas das comunidades. Nesse contexto, a cartografia social desponta como uma estratégia potente para revelar os espaços, atores e práticas que compõem o cuidado vivo no território. Conforme Merhy et al. (2014), essas “redes vivas” representam formas de organização social que emergem das relações cotidianas, especialmente em contextos de vulnerabilidade, sendo frequentemente invisibilizadas pelas lógicas institucionais.
A partir da leitura cartográfica do território da UBS Teotônio Vilela, foi possível identificar e visibilizar essas redes vivas em atuação, revelando um campo fértil para a promoção da saúde, construído a partir dos vínculos, saberes e práticas existentes no cotidiano da população local.
A metodologia adotada foi a partir de um enfoque participativo, organizada em três etapas principais: construção da cartografia social, planejamento da proposta de intervenção e execução da intervenção.
Com base nessas premissas, a experiência foi organizada em três etapas principais: (1) construção da cartografia social; (2) planejamento participativo da intervenção; e (3) execução da oficina de promoção da saúde.
1. Construção da Cartografia Social
A primeira etapa teve como foco a identificação de pontos e redes de cuidado presentes na área de abrangência da UBS. Para isso, foi elaborado um roteiro de escuta ativa, aplicado em reunião realizada no dia 2 de abril de 2025 com a participação da equipe multiprofissional (incluindo ACS, médica, enfermeira, gerente da unidade) e dois usuários do serviço. Durante o encontro, perguntas disparadoras estimularam o diálogo sobre práticas de cuidado desenvolvidas no território, bem como os principais desafios enfrentados.
Foi possível identificar uma série de experiências significativas, como o Centro de Cultura Afro-Brasileira Dandalunda, grupos de atividade física autônomos no Bosque das Arapiracas, uma associação de capoeira, um grupo de Alcoólicos Anônimos, entre outros coletivos que contribuem para o cuidado em saúde de forma não institucionalizada. O exercício cartográfico possibilitou a visualização dessas redes, revelando um cenário fértil para o desenvolvimento de ações intersetoriais.
2. Planejamento da Proposta de Intervenção
A devolutiva dos achados da cartografia à equipe da UBS ocorreu no dia 16 de abril de 2025, durante uma Reunião Administrativa, que contou com 19 profissionais. A apresentação seguiu uma metodologia dialógica, visando socializar as informações levantadas e construir, junto à equipe, a proposta de intervenção em promoção da saúde.
Durante o debate, foram discutidas as potencialidades e limites do território, incluindo a limitação de espaço físico da UBS — instalada em prédio alugado e sem estrutura adequada para ações coletivas. Diante disso, deliberou-se pela realização da oficina no CRAS Eva Pessoa, que oferece melhores condições de acolhimento. Também foi definida a articulação com a coordenação de Promoção da Saúde da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) para apoio técnico e institucional. A sistematização do plano de ação e as articulações necessárias ficaram sob responsabilidade da mestranda.
3. Execução da Intervenção: Oficina “Cuidar Juntos”
A oficina “Cuidar Juntos” foi realizada na tarde do dia 21 de maio de 2025, no CRAS Eva Pessoa. O público-alvo incluiu principalmente pessoas idosas, hipertensas e diabéticas — perfis priorizados a partir da leitura do território. Estiveram presentes 39 participantes da comunidade, em sua maioria mulheres.
A atividade foi estruturada com metodologias participativas e um ambiente acolhedor, com cadeiras dispostas em círculo e materiais para registro. Iniciou-se com uma dinâmica de apresentação simbólica, onde cada participante se apresentou a partir da identificação com um animal. Em seguida, uma roda de conversa foi guiada pela pergunta “O que é cuidado para você?”, com registro das falas em tarjetas, utilizadas para construir categorias de análise.
Profissionais da UBS conduziram falas educativas sobre alimentação saudável, saúde mental, uso racional de medicamentos e prevenção de doenças crônicas. A oficina também incluiu vivências com Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), como o uso de chás medicinais e técnicas de automassagem, além de uma sessão de exercícios físicos com orientação profissional. A avaliação da atividade foi realizada com a ferramenta “Semáforo do Conhecimento”, de forma participativa. Ao final, foi servido um lanche saudável e reforçado o compromisso de continuidade da ação em parceria com o CRAS.
Dificuldade em compreender os grupos de cuidado existentes e as necessidades do território da UBS Teotônio Vilela, agravada pela precariedade estrutural da unidade, motivou a iniciativa de Cartografia Social para aperfeiçoar as ações e serviços de saúde, promovendo maior participação da comunidade e alinhamento com a realidade local.
Nessa configuração territorial, foi possível identificar a presença de Redes Vivas, tanto nas ações de saúde promovidas pela UBS Teotônio Vilela quanto nas iniciativas autônomas da própria comunidade. Essas expressões revelam criatividade, resistência, solidariedade e a capacidade de produzir cuidado de forma coletiva e em rede. Diante desse cenário, tornou-se essencial fortalecer essas conexões e reconhecer os múltiplos sujeitos do cuidado, potencializando-o como uma prática compartilhada, transformadora e enraizada no território.
A proposta desenvolvida resultou na realização de oficina participativa voltada à promoção da qualidade de vida, utilizando metodologias ativas e diálogo entre saberes; na criação de um grupo fixo de cuidado na UBS, com foco na prevenção das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) e no incentivo ao autocuidado; e na valorização das redes vivas locais, integrando saberes populares, práticas tradicionais e ações institucionais.
Esses resultados estão em consonância com Mendonça e Nunes (2014), que evidenciam em seus estudos que atividades participativas em grupos de educação em saúde para pessoas com doenças crônicas contribuem significativamente para a autonomia dos sujeitos, favorecendo a troca de experiências e o fortalecimento de vínculos entre os participantes e os profissionais de saúde.
Nesse sentido, ao promover a integração entre os pontos de cuidado mapeados, os saberes da comunidade e as práticas de saúde da equipe da ESF, a intervenção reafirma o valor dos grupos como espaços potentes de cuidado compartilhado, conforme discutido por Mendonça e Nunes (2014). A experiência demonstrou que é possível construir estratégias educativas mais eficazes, sensíveis às especificidades territoriais e comprometidas com a produção de saúde como um bem comum.
Para implementar uma prática semelhante, recomenda-se priorizar a escuta sensível de profissionais e usuários, promovendo um ambiente de confiança e valorização mútua. É fundamental mapear as Redes Vivas do território, reconhecendo saberes populares, iniciativas autônomas e práticas já existentes que contribuem para o cuidado em saúde. A construção coletiva das ações deve considerar a realidade local, a infraestrutura disponível e a possibilidade de utilizar espaços alternativos, como escolas, praças ou equipamentos sociais. A articulação intersetorial amplia as possibilidades de atuação e sustentabilidade da intervenção. Invista na formação continuada das equipes, com foco em metodologias participativas, educação popular e trabalho em rede. Por fim, é essencial planejar o monitoramento e a avaliação de forma colaborativa, garantindo o ajuste contínuo das estratégias às necessidades da comunidade.
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