Autores:
Emilaine Oliveira Batista
Enfermeira da Unidade de Saúde da Família do Centro – Santa Cruz Cabrália – BA. Atua na coordenação de equipe e implementação das práticas integrativas e complementares em saúde.
Diego da Rosa Leal
Enfermeiro (COREN 98607), professor, terapeuta integrativo e coordenador do Npics Brasil. Consultor no projeto de implantação das PICS em Santa Cruz Cabrália – BA, com atuação em justiça restaurativa e inteligência sistêmica.
Rozilane de Jesus Melo
Agente Comunitária de Saúde e Profissional de PICs da USF do Centro – Santa Cruz Cabrália – BA.
Instituição de Vinculação:
Prefeitura Municipal de Santa Cruz Cabrália – Secretaria Municipal de Saúde
Núcleo de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde – Npics Brasil (Extensão CEJUSC)
Unidade de Saúde da Família do Centro – Atenção Básica
Local e Data:
Santa Cruz Cabrália – BA, Julho de 2025
Resumo
Este artigo apresenta um relato de experiência da Unidade de Saúde da Família do Centro, localizada em Santa Cruz Cabrália – BA, sob a coordenação da enfermeira Emilaine Oliveira Batista. O texto descreve a implantação e consolidação das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) no território, com foco nas rodas de terapia comunitária integrativa, uso de florais, auriculoterapia e abordagens sistêmicas como a constelação familiar. O artigo destaca também a atuação da agente comunitária Rozilane de Jesus Melo (Rozi Melo), que está sendo capacitada como referência técnica em constelação familiar no município, e o trabalho da terapeuta, colabora na condução das PICS. A experiência evidencia o protagonismo da equipe multiprofissional, os fluxos de escuta qualificada e o engajamento da comunidade, que vem se apropriando das práticas e promovendo sua disseminação por meio de relatos espontâneos de melhora. A atuação intersetorial, com apoio do CAPS, CEJUSC e extensão universitária, revela-se central para a consolidação do cuidado integral e humanizado na Atenção Básica.
Palavras-chave:
Práticas Integrativas e Complementares; Atenção Básica; Terapia Comunitária Integrativa; Constelação Familiar; Estratégia Saúde da Família; SUS.
Abstract
This article presents the experience report from the Family Health Unit (USF) of the Central District, located in Santa Cruz Cabrália, Bahia, under the coordination of nurse Emilaine Oliveira Batista. The report outlines the implementation and consolidation of Integrative and Complementary Health Practices (PICS), focusing on community integrative therapy circles, the use of flower essences, auriculotherapy, and systemic approaches such as family constellation. It also highlights the participation of community health agent Rozilane de Jesus de Melo (Rozi Melo), currently being trained as a technical reference in family constellation in the municipality, and therapist Ronda, a collaborator in conducting PICS. The experience emphasizes the role of the multidisciplinary team, the structured flow of qualified listening, and community engagement through spontaneous testimonials of improvement. The intersectoral collaboration with CAPS, CEJUSC, and university extension has been central to the consolidation of integral and humanized care within primary healthcare.
Keywords:
Integrative and Complementary Health Practices; Primary Healthcare; Community Therapy; Family Constellation; Family Health Strategy; Brazilian Unified Health System (SUS).
1. Introdução
As Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) têm ganhado espaço no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) como ferramentas de cuidado ampliado, promoção da saúde e fortalecimento dos vínculos comunitários. Reconhecidas pela Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), tais abordagens valorizam os saberes tradicionais, a escuta qualificada e a participação ativa dos sujeitos no seu processo de cura, promovendo o cuidado integral e humanizado no território.
No município de Santa Cruz Cabrália, Bahia, a implantação das PICS tem ocorrido de forma articulada entre a atenção básica, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC), a extensão universitária da Unesulbahia e o apoio da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e outras instituições, a nível nacional, através das atividades online do Núcleo de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (NPics Brasil), o CAPS e outros equipamentos da rede de atenção psicossocial.
Dentro desse contexto, a Unidade de Saúde da Família (USF) do Centro se tornou referência na implementação das PICS na atenção primária, por meio da coordenação da enfermeira Emilaine Oliveira Batista. Desde os primeiros momentos do projeto, ainda em sua fase embrionária, a unidade participou ativamente das experiências de rodas de terapia comunitária, oficinas manuais com abordagem terapêutica, acolhimento de pessoas em situação de sofrimento psíquico, e outras estratégias centradas no cuidado integral.
A presente narrativa parte do ponto de vista da própria profissional que lidera essas ações no território, revelando os caminhos, os desafios e as conquistas de um trabalho que envolve escuta, sensibilidade e transformação comunitária. O relato também destaca a atuação de profissionais da equipe multiprofissional, como a agente Rozilane de Jesus Melo (Rozi Melo), que avança na formação em constelação familiar, e a terapeuta também é responsável pelas aplicações de auriculoterapia, toques sistêmicos (Abordagem AQRIS), florais e outras práticas.
Este artigo visa, portanto, apresentar a experiência vivenciada na USF do Centro como um exemplo concreto de integração das PICS ao cotidiano da Estratégia Saúde da Família, contribuindo para o fortalecimento de um SUS mais acolhedor, sensível às realidades locais e aberto ao diálogo entre saberes.
2. Metodologia
Este artigo configura-se como um relato de experiência, com abordagem qualitativa, descritiva e narrativa, centrado na atuação da enfermeira Emilaine Oliveira Batista e a Agente Comunitária de Saúde Rozilane Melo na Unidade de Saúde da Família (USF) do Centro, em Santa Cruz Cabrália – BA. O objetivo é documentar e refletir sobre os processos de implantação, consolidação e evolução das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) no território.
A principal fonte da narrativa foi uma entrevista semiestruturada, realizada com a própria autora, enfermeira da unidade desde a implementação inicial do projeto Npics no município. A entrevista foi conduzida com base em roteiro temático e complementada com relatos espontâneos da profissional ao longo dos anos de atuação, especialmente durante a pandemia de COVID-19 e no enfrentamento das enchentes que atingiram a população local.
Foram também utilizados como suporte metodológico os seguintes recursos:
Observação participante da equipe técnica do Npics Brasil;
Registros das atividades promovidas no território (oficinas, rodas de conversa, encontros de formação e atendimentos, postagens divulgatórias no Instagram oficial do Npics/Cejusc);
Documentos internos da unidade e da Secretaria Municipal de Saúde;
Acompanhamento de casos clínicos encaminhados ao CAPS e integrados com o cuidado em PICS;
Referenciais da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC), bem como literatura científica sobre terapia comunitária, constelação familiar, florais e práticas de cuidado integrativo.
A metodologia adotada respeita os princípios da ética profissional, da confidencialidade e da valorização da escuta das vivências dos profissionais e usuários envolvidos. Os dados compartilhados foram previamente autorizados pelas autoras e pelas instituições envolvidas no processo.
3. Resultados e Discussão
3.1 Início da Implantação das PICS na USF do Centro
A Unidade de Saúde da Família do Centro, em Santa Cruz Cabrália, passou a integrar o processo de implantação das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) no município desde os primeiros movimentos do projeto Npics, ainda em sua fase embrionária, com apoio da Unesulbahia e Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), da Secretaria Municipal de Saúde e do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC), seguindo-se do grupo de voluntários agregados a estas instituições.
A enfermeira Emilaine Oliveira Batista esteve à frente da articulação local, mobilizando sua equipe, promovendo rodas de conversa e participando de oficinas com abordagens integrativas. A prática que mais chamou sua atenção desde o início foi a Terapia Comunitária Integrativa (TCI), que ela reconhece como um potente instrumento de escuta qualificada e expressão emocional no território.
“As rodas de terapia comunitária permitem o compartilhamento de questões que envolvem tanto os problemas individuais, quanto familiares e comunitários. Fizemos várias oficinas utilizando essa metodologia, principalmente no período da enchente, para acolher o sofrimento das famílias.” (Emilaine)
A TCI foi utilizada de forma estratégica durante momentos de crise, como as enchentes que atingiram a cidade, permitindo um espaço de reconstrução emocional para os afetados, mesmo diante de perdas materiais significativas.
3.2 Introdução dos Florais e Atendimento de Casos Emocionais
Com a evolução do trabalho, a equipe da USF do Centro passou a incorporar o uso dos Florais de Bach como recurso complementar nas rodas de TCI e atendimentos individuais. A referência técnica para essa prática foi a agente comunitária Rose, formada em terapia floral e atuante como facilitadora na unidade.
A enfermeira relata diversos casos exitosos envolvendo o uso dos florais, especialmente em situações de ansiedade, luto e sofrimento emocional decorrente das perdas enfrentadas pela população.
“A gente teve resultados muito interessantes com os florais. Casos de pessoas que estavam com ansiedade, vivendo lutos… A experiência foi tão positiva que hoje a própria comunidade vem pedir os florais como parte do cuidado.” (Emilaine)
3.3 Atuação Intersetorial com o NASF, CAPS, Cejusc e a Constelação Familiar
Um dos momentos mais marcantes relatados pela equipe foi o atendimento de uma senhora acompanhada há muitos anos pelo CAPS, que também participou da primeira constelação familiar oficial da atenção básica, em formato online no município, durante o período pandêmico. O caso foi conduzido de forma integrada entre o NASF, CAPS, a USF e a equipe do Npics.
“Ela participou da constelação online e depois voltou várias vezes contando como aquilo foi importante para a vida dela. Isso marcou muito nossa equipe.” (Diego)
Esse caso impulsionou a consolidação da abordagem sistêmica na rede e fortaleceu a formação de novos profissionais. A agente comunitária Rozilane de Jesus de Melo (Rozi Melo) passou a ser preparada, para atuar futuramente como referência técnica em constelação familiar, com apoio do Npics Brasil e da equipe de coordenação local.
3.4 Atendimento Integrado, Grupos de Gestantes e Engajamento da Equipe
Outro destaque da experiência foi a integração das PICS nos grupos de gestantes, onde foram realizadas atividades como toque sistêmico (AQRIS), escuta, lavagem dos pés e práticas de relaxamento. A enfermeira enfatiza que essas ações têm fortalecido o vínculo com as gestantes e contribuído para um pré-natal mais humanizado.
A USF estabeleceu um fluxo de escuta qualificada, onde os pacientes são acolhidos, avaliados e, quando pertinente, encaminhados para o atendimento integrativo com a terapeuta Rozi Melo, referência da unidade nas práticas.
“Tem sido tão exitoso que os próprios pacientes fazem a divulgação. As pessoas chegam dizendo que ouviram falar que aqui tem uma prática que ajudou alguém da família. Isso é muito significativo.” (Emilaine)
A prática mais procurada e com maior adesão na unidade é a auriculoterapia, cujos efeitos são percebidos tanto pela equipe quanto pelos usuários como uma ferramenta de regulação emocional e melhora de sintomas físicos.
4. Considerações Finais
A experiência vivida na Unidade de Saúde da Família do Centro, em Santa Cruz Cabrália, sob a coordenação da enfermeira Emilaine Oliveira Batista, demonstra de forma concreta o potencial transformador das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) quando integradas de maneira sensível, ética e estruturada à Atenção Básica.
A trajetória aqui relatada evidencia que a escuta qualificada, o acolhimento comunitário e a atuação em rede — envolvendo CAPS, CEJUSC, universidades, agentes comunitários e terapeutas de PICs — são elementos centrais para a consolidação de um cuidado mais humano, sistêmico e resolutivo no cotidiano do SUS.
Os resultados alcançados com rodas de terapia comunitária, florais, constelação familiar, auriculoterapia e grupos de gestantes mostram que a saúde integral é viável quando há envolvimento da equipe, abertura da gestão e confiança da comunidade.
Casos emblemáticos, como o da paciente acompanhada pelo CAPS e beneficiada pela constelação familiar online, revelam que é possível superar os limites tradicionais da assistência e promover verdadeiros processos de equilíbrio. A preparação da agente Rozi Melo como referência técnica em constelação familiar reforça o compromisso da rede com a formação continuada e a sustentabilidade das práticas.
Por fim, este relato reafirma que a integração das PICS no território é não apenas desejável, mas necessária para enfrentar os desafios contemporâneos da saúde pública, principalmente no cuidado da saúde mental, emocional e espiritual da população. A experiência de Santa Cruz Cabrália pode servir de inspiração e modelo para outros municípios comprometidos com um SUS mais integral, participativo e restaurador.
5. Referências Bibliográficas
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SANTOS, Boaventura de Sousa. A Crítica da Razão Indolente: Contra o Desperdício da Experiência. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
STAM, Jan Jacob. O Essencial é Simples: Ensaios Sistêmicos. São Paulo: Atman, 2019.
Autores:
Emilaine Oliveira Batista
Enfermeira da Unidade de Saúde da Família do Centro – Santa Cruz Cabrália – BA. Atua na coordenação de equipe e implementação das práticas integrativas e complementares em saúde. É grande parceira no processo de estruturação do Npics no município, com participação direta na organização das rodas de terapia comunitária, atendimentos coletivos e ações educativas com gestantes.
Rozilane de Jesus Melo
Agente Comunitária de Saúde da USF do Centro – Santa Cruz Cabrália – BA. Formada nos cursos do Npics com ênfase em terapia floral, escuta qualificada e outras práticas integrativas. Está em processo de formação avançada para se tornar referência técnica em constelação familiar sistêmica no município. Atua na mediação entre comunidade e equipe multiprofissional, com foco na promoção da saúde integral e humanizada.
Diego da Rosa Leal
Enfermeiro (COREN 98607), professor, terapeuta integrativo e presidente do Npics Brasil. Articulador e Consultor do processo de implantação das PICS em Santa Cruz Cabrália – BA, com atuação em justiça restaurativa, educação popular, constelação familiar e inteligência sistêmica.
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