A auriculoterapia é uma prática integrativa e complementar em saúde reconhecida e cada vez mais utilizada para promover, manter e restaurar a saúde física e mental. Fundamentada em diferentes racionalidades médicas — como a Reflexologia, a Biomedicina Neurofisiológica e a Medicina Tradicional Chinesa — vem sendo amplamente implementada no Brasil, com impactos positivos sobre a saúde mental e a qualidade de vida de profissionais de saúde e estudantes universitários.
Este relato apresenta a experiência institucional de implantação da auriculoterapia na Unidade de Humanização e Cuidado do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CCS/UFRJ). Criada em 2017, a unidade foi concebida para oferecer apoio à comunidade acadêmica — professores, estudantes e técnicos-administrativos — por meio de um modelo holístico de cuidado que compreende a cura como um processo integrativo envolvendo corpo, mente e espírito. A iniciativa surge em um contexto de crescentes desafios em saúde mental no meio acadêmico e adota o modelo biopsicossocial-espiritual, abordando as dimensões físicas, emocionais, sociais e espirituais da experiência humana.
O protocolo atualmente em vigor foi iniciado em março de 2025. O serviço é oferecido de forma gratuita e voluntária por profissional certificado em auriculoterapia pela Universidade Federal de Santa Catarina e pelo Ministério da Saúde. Os atendimentos ocorrem semanalmente (às terças-feiras), das 10h30 às 13h30, mediante agendamento prévio por e-mail. A divulgação é realizada em redes sociais e por meio de cartazes afixados em locais de grande circulação no campus.
Cada sessão dura cerca de 10 minutos, sendo que a primeira consulta varia entre 20 e 30 minutos para permitir uma avaliação mais abrangente. Recomenda-se um plano terapêutico de 5 a 8 sessões, conforme evolução e necessidade do participante. No primeiro atendimento, são selecionados até 10 pontos auriculares a serem mantidos em todas as sessões. Ao final de cada encontro, orienta-se manter as sementes de mostarda na orelha por cinco dias e realizar automassagem nos pontos estimulados três vezes ao dia para potencializar os efeitos terapêuticos.
A metodologia inclui: (1) escuta e presença compassiva, anamnese e entrevista estruturada inicial; (2) aplicação de sementes de mostarda em pontos auriculares de acordo com a queixa principal; e (3) imposição de mãos sobre a região auricular, prática culturalmente reconhecida em diferentes tradições. Durante a primeira consulta, coletam-se dados sociodemográficos, histórico clínico, uso de medicamentos, religiosidade e espiritualidade, experiências prévias com práticas complementares ou espirituais e sofrimento emocional associado à queixa principal. A intensidade da dor — física e emocional — é avaliada por meio da Escala Verbal Numérica (EVN, 0 a 10) antes, durante e após a intervenção. Todas as informações são registradas em relatórios internos, em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD – Lei nº 13.709/2018).
A crise de saúde mental no meio acadêmico demanda respostas sustentáveis e concretas. Em um ambiente marcado por sobrecarga, competição e isolamento, a iniciativa busca oferecer cuidado institucional, suporte e prevenção por meio de uma prática integrativa em saúde, associada à escuta ativa e compassiva. A proposta promove autocuidado e pertencimento, sustentada por um modelo biopsicossocial-espiritual, em contraponto à visão mecanicista predominante, e contribui para a transformação cultural em direção a uma saúde integral na universidade.
Uma análise preliminar dos dados coletados entre março e julho de 2025 mostra que 9 pessoas foram atendidas, incluindo 2 técnicos-administrativos, 1 doutorando e 3 estudantes de graduação. A média de idade foi de 31 anos. Entre os participantes, 89% se autodeclararam negros e 11% brancos.
Todos (100%) relataram ansiedade como uma das principais queixas, e cerca de 44% apontaram preocupações excessivas. Medo e tristeza foram relatados por 22% cada. Além disso, 78% indicaram enfraquecimento da força de vontade, 44% relataram pessimismo, 67% apresentaram insônia, 67% mencionaram ideias fixas e 78% relataram pensamentos intrusivos.
Com relação à dor física, 56% relataram algum nível de dor na entrevista inicial: um com dor leve (EVN=3), dois com dor moderada (EVN=4 e 5) e dois com dor intensa (EVN=8). Já a dor emocional foi referida por 78%: um com dor leve (EVN=3), dois com dor moderada (EVN=5 e 6) e três com dor intensa (EVN=7).
Entre os 22% que completaram o tratamento, 11% relataram redução da dor física de moderada para leve (EVN inicial=4, final=2) e 11% redução da dor emocional de moderada para ausência de dor (EVN inicial=6, 3ª sessão=0). Contudo, da terceira até a última sessão, a dor emocional voltou a aumentar, chegando a nível severo (EVN=8). Apesar disso, a participante relatou engajamento em práticas de autocuidado, acompanhamento psicoterapêutico e busca ativa de estratégias para lidar com suas dificuldades.
Além disso, 44% dos atendidos faziam psicoterapia, 66% relatavam prática de atividade física ou fisioterapia e 67% cultivavam práticas espirituais como oração, leituras edificantes ou meditação. No total, 78% afirmaram que a espiritualidade ou fé os ajuda a enfrentar suas dificuldades. Na data da análise, 22% ainda estavam em tratamento e 56% haviam interrompido antes de completar o número de sessões recomendadas, sendo investigadas as razões dessas desistências. Há também estudo em andamento sobre a viabilidade de ofertar curso de formação para voluntários em auriculoterapia, visando ampliar a capacidade do serviço.
Entre os principais desafios estão: aprimorar a gestão de dados, formar novos auriculoterapeutas, expandir a oferta, refinar protocolos, estruturar acompanhamento longitudinal, realizar pesquisas avaliativas de resultados e sensibilizar a gestão universitária. O reconhecimento institucional com apoio financeiro e logístico é fundamental para a sustentabilidade e o impacto da iniciativa. A integração de práticas de cuidado à rotina acadêmica constitui tanto uma ação terapêutica quanto um imperativo político-ético, diante do sofrimento psicológico amplamente disseminado nas comunidades universitárias.
Auriculotherapy is a recognized integrative and complementary health practice increasingly used to promote, maintain, and restore both physical and mental health. Grounded in diverse medical rationalities—such as Reflexology, Neurophysiological Biomedicine, and Traditional Chinese Medicine—this approach has been widely implemented in Brazil, with positive impacts on the mental health and quality of life of healthcare professionals and university students.
This abstract presents the institutional experience of implementing auriculotherapy at the Humanization and Care Unit of the Health Sciences Center, Federal University of Rio de Janeiro (CCS/UFRJ). Established in 2017, the unit was designed to support the academic community—including professors, students, and administrative staff—through a holistic model of care that acknowledges healing as an integrative process involving body, mind, and spirit. The initiative emerges within a broader context of growing mental health challenges in academic settings and adopts the biopsychosocial-spiritual model of health, addressing the physical, emotional, social, and spiritual dimensions of human experience.
The current auriculotherapy protocol was initiated in March 2025. The service is offered free of charge and voluntarily provided by a healthcare professional certified in auriculotherapy by the Federal University of Santa Catarina and the Brazilian Ministry of Health. Sessions are held once a week (Tuesdays), from 10:30 a.m. to 1:30 p.m., by prior appointment via the unit’s email. The practice is promoted through social media and posters placed in high-traffic campus areas.
Each session lasts approximately 10 minutes, with the initial appointment taking 20 to 30 minutes to allow for a more comprehensive assessment. The protocol recommends a treatment plan of 5 to 8 sessions, depending on the individual's progress and needs. On the first day, no more than 10 auricular points are selected to be used throughout all sessions. At the end of each session, participants are advised to retain the mustard seeds on the auricle for five days and to perform gentle self-massage on the stimulated points three times daily to enhance therapeutic effects.
The methodology includes: (1) compassionate listening and presence, anamnesis, and a structured intake interview conducted during the first session; (2) application of mustard seeds to auricular points based on the main complaint; and (3) laying on of hands over the auricular region—a culturally sensitive practice acknowledged across multiple traditions.
During the initial consultation, data are collected on sociodemographic profile, clinical history, medication use, religiosity and spirituality, previous experience with complementary or spiritual practices, and emotional or psychological distress associated with the main complaint. Pain intensity—both physical and emotional—is measured using the Verbal Numeric Scale (VNS, range 0-10) before, during, and after the intervention. All information is recorded in internal reports, in accordance with Brazil’s General Data Protection Law (LGPD – Law No. 13,709/2018).
The escalating mental health crisis in academia calls for sustainable, concrete responses. In an environment marked by overload, competition, and isolation, this initiative offers institutional care, support, and prevention through an integrative complementary health practice coupled with active and compassionate listening. It fosters self-care and belonging via a biopsychosocial-spiritual model, challenging the prevailing mechanistic approach and promoting cultural transformation toward holistic health in academia.
A preliminary analysis of data collected between March and July 2025 shows that 9 individuals were treated by the sector, including 2 administrative staff members, 1 doctoral student, and 3 undergraduate students. The average age of participants was 31 years. A total of 89% self-identified as Black and 11% as White.
All participants (100%) reported anxiety as one of their main complaints and approximately 44% also reported feelings of worry. Fear and sadness were each reported by 22% of participants. Additionally, 78% reported weakened willpower, 44% reported pessimism, 67% experienced insomnia, 67% reported having fixed ideas, and 78% described intrusive thinking patterns.
Regarding physical pain, 56% of participants reported experiencing some level of pain during the initial interview: one person described mild pain (VNS=3), one moderate pain (VNS=4), another moderate pain (VNS=5), and two reported severe pain (VNS=8). Emotional pain was reported by 78% of participants: one person described mild emotional pain (VNS=3), two reported moderate emotional pain (VNS=5 and 6), and three reported severe emotional pain (VNS=7).
Among the 22% who completed the treatment, 11% reported a reduction in physical pain from moderate to mild (initial VNS=4, final VNS=2), and 11% experienced a decrease in emotional pain from moderate to no pain between the first and third sessions (initial VNS=6, third session VNS=0). However, from the third to the final session, emotional pain increased to a severe level (VNS=8). Despite this, the participant reported engaging in self-care practices, attending psychotherapy, and actively seeking ways to address emotional challenges.
Furthermore, 44% of participants reported attending psychotherapy, 66% reported engaging in physical activity or physiotherapy, and 67% engaged in spiritual practices such as prayer, uplifting reading, or meditation. A total of 78% stated that their spirituality or faith helps them cope with their current difficulties. At the time of analysis, 22% of participants were still undergoing treatment, while 56% discontinued the proposed treatment before completing the number of sessions recommended by the therapist. An investigation is underway to better understand the reasons behind treatment discontinuation in each case.
Additionally, we are exploring the possibility of offering a training course to prepare more volunteer auriculotherapists, aiming to increase service capacity and expand support through this practice.
Key challenges include improving data management, training new auriculotherapists, expanding services, refining protocols, establishing longitudinal follow-up, conducting research to evaluate outcomes, and raising awareness among academic leadership. Institutional recognition with financial and logistical support is essential for sustainability and impact. Integrating care practices into university routines is both a therapeutic and a political-ethical imperative given the widespread psychological distress in academic communities.