CNS posiciona-se contra quebra do piso da Saúde

Conselho Nacional de Saúde defende, em recomendação pública: investimento no SUS deve ser garantido, nas bases da Constituição

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Fernando Pigatto, presidente do CNS: para órgão, é preciso ampliar receita do SUS — e não achatá-la, como pretendem setores do governo. Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil

Diante do risco de o piso constitucional de investimentos em Saúde não ser respeitado em 2023, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) publicou, no dia 21/9, uma recomendação importante. Não apenas defende a manutenção dos 15% da receita corrente líquida da União a cada ano, mas reafirma a necessidade de ampliar os recursos a partir de 2024 – conforme foi decidido na 17ª Conferência Nacional de Saúde.

A situação é delicada. Não se trata de uma tentativa direta do governo de minar o piso constitucional. Mas tecnocratas – como criticou Paulo Capel Narvai em artigo – lotados nos ministérios econômicos buscam subterfúgio para não respeitar algo que está definido na Constituição. Em entrevista ao Outra Saúde, o economista e presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABrES), Francisco Funcia, em 20/9, explicou seus meandros.

Um projeto de lei já aprovado pela Câmara interpreta de forma equivocada que o mínimo de 15% refere-se à receita estimada no final do ano passado para 2023. Desconsidera-se a receita real, que será superior. “A partir do momento em que se está no governo, se executa o orçamento e se constata um cenário de que a receita vai ser maior, complementa-se o orçamento. É essa a lógica”, explica o economista.

Ambos, Funcia e Narvai, chamam atenção para o fato de não ter havido debate público sobre a tentativa de driblar o piso. Não houve qualquer consulta ao CNS ou mesmo a órgãos como o Conass, que reúne as secretarias estaduais de saúde e o Conasems, que representa os secretários municipais. Prontamente, o Conselho se manifestou sobre a questão, chamando a atenção para o fato de que “é atributo legal dos conselhos de saúde, nos três níveis de governo, estabelecer diretrizes para a formulação de prioridades na alocação de recursos públicos no setor”.

No documento, assinado pelo presidente do CNS, Fernando Pigatto, a entidade defende o caminho contrário: que o governo tenha no horizonte uma parcela a cada ano maior para a Saúde. O Conselho menciona uma ação importante, organizada em 2013: o Movimento Saúde+10 que propôs um projeto de lei de iniciativa popular nesse âmbito, com mais de 2 milhões de assinaturas. A ideia era estabelecer que a base de cálculo fosse 10% das Receitas Correntes Brutas da União – o que representaria 19,4% da Receita Corrente Líquida.

O aumento do investimento é essencial para que se alcance uma das diretrizes da 17ª Conferência, ocorrida em julho deste ano: que os gastos públicos com Saúde cheguem a representar 6% do PIB brasileiro. É uma reivindicação consolidada entre o movimento sanitarista, também defendida por entidades como a Frente pela Vida. Outro indicador importante, para o qual os movimentos chamam a atenção, é o investimento per capita em Saúde. Em 2022, esse gasto foi de R$ 646 por habitante  – o CNS alerta para a meta necessária de R$ 1.000 per capita.

O documento do CNS também vê com preocupação as notícias de integrantes do governo que acreditam que é possível rever os pisos constitucionais de Saúde e Educação, para que os gastos sociais caibamdentro do Arcabouço Fiscal, sancionado em agosto. Para o Conselho, esse flerte com o racionalismo neoliberal confronta “o histórico de luta do controle social do SUS pelo financiamento adequado e suficiente para o atendimento das necessidades de saúde da população”, além de ignorar o princípio constitucional de que a Saúde é dever do Estado.

Por Gabriela Leite, editora do site Outra Saúde, onde a reportagem foi publicada originalmente em 22/9/2023.

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