Espaço de reconhecimento da importância científico-cultural dos conhecimentos tradicionais e de compartilhamento de suas práticas, de forma a conferir proteção e legitimação efetiva a estes saberes.
A relação entre Saberes Tradicionais e Saúde acontece nas mais remotas épocas do conhecimento humano, estes formam um conjunto de informações, modos de saber-fazer, criar e cuidar, que são transmitidos oralmente, como tática de resistência, em ritos de partilha de saberes de determinado grupo, transcendendo gerações, via de regra agregados à biodiversidade, que representam seu trabalho, cultura, práticas e costumes; dialogando profundamente com o conceito de saúde integrativa preconizado pela OMS, enquanto estado dinâmico e integrativo de bem-estar físico, mental, espiritual e social, e não meramente a ausência de doença.
Os saberes/fazeres tradicionais em saúde versam sobre o universo das artes de cuidar das benzedeiras, rezadeiras, parteiras, doulas, capoeiristas, jongueiros, raizeiros, cirandeiros, das etnias indígenas, africanas, árabes, ciganas, caboclas, assim como os juremeiros e suas medicinas de cura com seus maracatuzeiros, conguistas e emboladores, repentistas, tocadores de afoxé, samba de roda, além dos demais povos de tradição de terreiros afro-brasileiros.
Neste sentido a OMS, desde a década de 70, aponta para a importância das medicinas tradicionais e a necessidade de reconhecimento desses saberes nos sistemas oficiais de saúde pare que todos os povos possam ter uma melhor saúde.
Com o avanço do reconhecimento desses saberes, foram reconhecidas as Medicinas Tradicionais, Complementares e Integrativas (MTCI), que vem crescendo em institucionalização, onde 98 países já reconhecem essas práticas a partir de leis nacionais.
Segundo a OMS, a medicina tradicional tem uma longa história, ancestralidade ou tradição. É a soma de conhecimentos, capacidades e práticas baseadas em teorias, crenças e experiências de diferentes culturas, explicáveis pelos métodos científicos atuais ou não, utilizadas para manter a saúde e prevenir, diagnosticar, melhorar ou tratar doenças físicas e mentais.
Destacamos a importância científico-cultural dos conhecimentos tradicionais, a urgência na alteração de padrões culturais, educacionais, comunicacionais em saúde e suas práticas, de forma a conferir proteção e legitimação efetiva a estes saberes, ante o reconhecimento de sua imprescindibilidade à ciência e à humanidade.
No Brasil, o Sistema Único de Saúde reconhece as práticas e saberes tradicionais a partir de diferentes políticas de saúde, como a Política Nacional de Educação Popular em Saúde, que reconhece as práticas populares de cuidado, a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas que reconhece os sistemas tradicionais indígenas de saúde, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Povo Cigano/Romani, que reconhece suas práticas tradicionais. Todas essas práticas realizadas pelas comunidades são essenciais para a saúde da população.
O SUS também reconhece as práticas realizadas pelos profissionais de saúde a partir da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC) e da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF) com o intuito de ampliar as abordagens de cuidado e as opções terapêuticas ofertadas pelos profissionais de saúde para a população, devendo estar sempre em diálogo com os saberes tradicionais do território.
No nosso país, existe um vasto legado dos povos originários, indígenas e afrodescendentes que apontam de um maior reconhecimento, tanto social como científico. Desde os primórdios da nossa nação, saberes tradicionais a eles pertencentes e fazem parte da promoção e atenção em a uma saúde Integral. Por exemplo, atualmente consta na Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse ao SUS (Renisus), que a esmagadora maioria das espécies que dela fazem parte são utilizadas pelas culturas afro-brasileiras.
Destarte, a Comissão de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde do Ideia SUS – FIOCUZ (CPICS / IdeiaSUS) propõe o desenvolvimento da Comunidade de Saberes Tradicionais no sentido de promover a necessária atenção a este campo do saber/fazer em saúde, mapeando e partilhando os saberes dessas práticas.